quarta-feira, 4 de julho de 2018

Crentes na Copa? - Parte II


F
alamos anteriormente sobre a entrada da cultura coríntia na igreja, cultura esta de competições, por isso retomo este aspecto, mas acrescentando o capítulo 6:1-8. O contexto é bem conhecido e revela que estava havendo demandas e rivalidades entre os irmãos (cf. I Co 6:1,7). Muito embora o texto não especifique o motivo pelo qual litigavam, o contexto revela que a cidade de Corinto era entregue ao glamour erótico, sendo inclusive anfitriã da deusa Afrodite, a mesma Vênus, que como deuses greco-romanos, despertavam a competição e altruísmo rival, porquanto os deuses greco-romanos tinham suas peripécias marcadas por competições entre mortais e outros deuses. Portanto, a verve coríntia, marcada com maior ênfase, era a sensualidade e as competições.
Falamos que tal cultura havia entrado na igreja, e, aqui no capítulo 6 encontra-se o ápice do espírito rival e competidor. Diante da situação, Paulo escreve em sua segunda carta: “Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis; porque que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas? E que concórdia há entre Cristo e Belial? Ou que parte tem o fiel com o infiel? E consenso tem o templo de Deus com os ídolos? Porque vós sois o templo do Deus vivente, como Deus disse: Neles habitarei e entre eles andarei; e eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo. Pelo que saí do meio deles, e apartai-vos, diz o Senhor; e não toqueis nada imundo, e eu vos receberei; e eu serei para vós pai, e vós sereis para mim filhos e filhas, diz o Senhor todo poderoso.” (II Co 6:14-18, cf. Is 52:11 e Ap 18:4).
Belial, no antigo testamento, era um nome genérico, segundo John Davis (2005, p. 169): é um circunlóquio de origem semítica, usado em vez de um adjetivo apropriado, para designar os ímpios, cujo significado no hebraico é: indignidade, perversidade.
No livreto “Afinal o que está Satanás fazendo?” (LUGT, 2000, p. 11), diz ser sem valor, ou maligno e perverso. Sendo um termo personificado, ou seja, atribuído à pessoa, no caso Satanás, veja II Coríntios 6:15.
A associação descrita por Paulo não é apenas andar com pessoas descrentes, mas fazer aliança com Satanás, por mais que seja duro admitir. Na realidade, os coríntios não foram ensinados a se conformarem com a cultura deles sob pretexto de melhorá-la ou tornar o mundo melhor, ou dizer: sou corintiano, sou cidadão ou algo parecido. O que Paulo disse é que eles deveriam sair do meio, ou seja, deixar o pecado, crentes frios e secularizados olham para o que é próprio de Belial, Satanás, de modo amistoso, no caso a cultura deles, neste aspecto não seria associada com a justiça, pois a comunhão e concórdia é impossível.  
O verso 18, do capítulo 6 de II Coríntios diz que só se separando do pecado, ou seja, o que é imundo, seríamos filhos e filhas de Deus, ficando claro que tal separação só é possível quando o homem se arrepende e recebe Cristo por seu Salvador e Senhor, e não apenas abstinência de hábitos meramente, mas a separação do mundo através da conversão pela graça por meio da fé, pois nossa salvação compreende espírito, alma e corpo, em três tempos: passado (pecados anteriores), presente (renúncia ao pecado pelo processo de santificação) e do juízo vindouro (estando reconciliados com Deus em Cristo).
Agora, observe a expressão: “templo de Deus”, ela é curiosa pois o templo é nosso corpo individualmente, enquanto que coletivamente ou unidos, somos o corpo de Cristo, isto é, a igreja, não devemos reservar um altar para ídolos, pois somos templo e casa de Deus.
O ídolo erótico tratado na carta como a prostituição sexual, se praticada, consuma um pecado contra o nosso corpo, então podemos dizer que juntar os membros de Cristo (nós), com a meretriz só veiculará pecado e vergonha ao corpo de Cristo. A igreja é santa, separada do mundo, e isso é visto a partir do termo grego ekklesia, que pressupõe que foi tirada do mundo, logo, ela não é moldada com a forma de uma cultura que ofenda aos princípios irrevogáveis de Deus.
Jesus não disse que nos adequaria ao mundo, pelo contrário, ele disse que nos tirou do mundo (cf. Jo 8:23 e 17:14, I Jo 3:13, 2:15 e 4:5). Sobre nós disse Jesus: “Não são mundo como eu do mundo não sou.” (Jo 17:16). Seria no mínimo estranho e parcial, uma mensagem que nos diz que não somos do mundo, se ainda continuássemos segundo a glória deste mundo?
Vimos que Jesus não aceitou os reinos ou governos deste mundo, nem a glória deles, e quando falo sobre os reinos e sua glória, refiro-me ao sistema ideológico oposto a Deus. Kosmos é um termo grego que aparece em João 18:36, onde Jesus diz que seu reino não é deste mundo. Kosmos traz a ideia de ordem, ordenar, repartir, distribuir e adornar. Inclusive, a palavra, cosmético para embelezar, vem de kosmos. No novo testamento, o termo aborda o sistema de coisas de modo abrangente, no âmbito social político e econômico. Portanto os poderes políticos e a glória deles em confronto a Deus e seus princípios morais e espirituais.
Ainda sobre associação com Belial, o texto de I Coríntios 6:14-18, é muito similar a Apocalipse 18:4, que nos diz: “E ouvi outra voz do céu, que dizia: Sai dela povo meu, para que não sejas participantes dos seus pecados e para que não incorras nas suas pragas.” O texto retrata a figura de uma mulher que leva o nome de GRANDE BABILÔNIA, A MÃE DAS PROSTITUIÇÕES E ABOMINAÇÕES DA TERRA (cf. Ap 17:5). O verso 18 diz: “A mulher que vistes é a grande cidade que reina sobre os reis da terra.” Quem dominava neste contexto da revelação de Apocalipse era Roma (cf. I Pe 5:13) conhecida como Babilônia, pois foi quem recebeu e manteve um poder político-religioso atuante. Conforme o texto se levantará no futuro, pois a visão foi para o futuro, sob o comando do Anticristo. Tal sistema por ser religioso unificado, ou seja, ecumênico, sendo encabeçado pela política e pela religião de modo homogêneo e globalmente.
No aspecto religioso terá como líder o falso profeta, a besta que sobe da terra (cf. Ap 13:11-18, 16:13, 19:20 e 20:10). O catolicismo em sua ação bajuladora, é quem inclusive defende o envolvimento e toma parte na política e em jogos apreciando e até abençoando a copa do mundo.
Infelizmente muitas igrejas evangélicas estão incluídas nesse processo, pois se torna uma só com o mundo, e toma parte em assuntos que não lhe cabe nem Cristo ordenou.
Em Apocalipse 17:2 diz que: “os reis da terra e os que habitam na terra se embebedaram e se prostituíram com ela, com o vinho da sua prostituição.” Ou seja, os poderes terrenos e seus súditos estão de igual modo empenhados no mesmo intento e propósito.
Atente que até a descrição da aparência da mulher é uma aparência extravagante, com muitos adornos, que já estampa uma cultura de vaidade estética, luxúria e o próprio vício, típico das prostitutas da cultura daquele contexto, mas que é atual em sua expressão, pois hoje o mundo lança sua cultura de apego aos cosméticos, adornos, extravagância, muita sensualidade e vícios. A igreja ou religião do falso profeta que estará a serviço do Anticristo, a besta que sobe do mar, tem a cultura já globalizada do mundo e muito facilmente se adequa ao gosto, por isso é identificada com uma taça e embriaga. Vejam que seu perfil é apetecível e sedutor, pois arvora a insígnia do poder político dos reinos deste mundo (alçada política) e a glória deles (alçada cultural).
Aqui fica a advertência, porquanto não está escrito a esmo, mas com o propósito a que venhamos a mudar nosso conceito, porque a paixão por poder político e a glória de tais poderes e reinos não foi nem é o desejo de nosso Senhor Jesus Cristo para sua igreja.
Seria muito ingênuo acreditar que os jogos olímpicos e os da copa, entre outros eventos semelhantes, feitos ou organizados pelo mundo não estarão no programa governamental do Anticristo. Veja que a mulher está embriagada do sangue dos santos e das testemunhas de Jesus (cf. Ap 17:6). Muito embora aponte para o futuro, não se desvincula das reminiscências dos mártires da igreja primitiva. Esta mulher símbolo deste poder tanto embriaga-se como embriaga os outros. A si própria, por derramar muito sangue perseguindo o povo de Deus, aos outros, porque seduz com seu fascínio religioso espúrio, salvaguardando e aprovando empreendimentos e decisões segundo o gosto da maioria. E aqui vale lembrar que Roma imperial em seu delírio babilônico derramou muito sangue, matando muitos cristãos exatamente em jogos, se o mundo não faz o mesmo por jogos hoje, é pelo fato de não ser viável matar sua mão de obra, pois a questão é mercadológica, os países que promovem tais eventos não conseguiriam juntar suas fortunas.
Os crentes, nos primórdios da igreja, não satisfaziam Roma, pelo contrário, a contrariava. Isto mostra que a igreja atual está em péssima situação, pois está envolvida com o mundo, o contrário da igreja no passado, os cristãos estavam mortos para o mundo, sendo, portanto, imprestáveis para os propósitos ambiciosos e carnais do mundo de então. A igreja que não tinha o poder dos reinos terrenos nem a glória deles, era a igreja que tinha o poder para derrotar Satanás, pois o enfrentava com mãos vazias, porém cheios do Espírito e da palavra, a de hoje, não o enfrenta, porquanto recebe sua glória e suas armas. 
Hoje, em particular no Brasil, a mulher pode até não estar embriagada do sangue, pois não persegue os crentes como antigamente, mas está prostituindo e servindo vinho da sua prostituição seduzindo com a política partidária, expressão de uma parte dos reinos deste mundo e a glória deles já que estamos agora falando de um caso local. E o efeito não daria outro, é a apostasia e afastamento da simplicidade do evangelho de Cristo, operada pela serpente. Sendo que também aos coríntios foi feita tal advertência (II Co 11:3). A prostituta Babilônia segura uma taça cálice ou copa. De duas uma, ou estamos contra este sistema perverso ou estamos bebendo e enchendo tal taça.
Que Deus tenha misericórdia, e tem, mas os homens necessitam urgentemente de arrependimento e deixarem essas vaidades que não dignificam o crente em absolutamente nada!
O Coliseu de Roma estremecia quando realizavam mais uma exibição, nem animais escapavam (O’Reilly, 2008). Na defensiva muitos dizem que isso passou e não se compatibiliza com o esporte praticado no mundo atual. Hoje é ainda pior, pois os jogos sem tirania e derramamento de sangue indica que eles se tornaram muito mais sedutores e inadequados aos que servem a Cristo, afinal, sua forma atual continua contradizendo os ensinos de Cristo. Pois assim o comprometimento com ele tona-se mais acessível e humano em termos políticos, mas em nada se conforma com a natureza do evangelho e reino de Deus, onde o Senhor revela sua incoerência diante de uma cultura de disputa carnal que promove ascendência ao mundo da fama e proporcionando ídolos.
Em Gálatas 5:19-21, temos o fruto do Espírito que, por natureza, nos faz retomar o assunto da regeneração que nos reporta ao confronto com uma cultura reinante inassociável ao plano de Deus. O oposto do fruto do Espírito, ou seja, das práticas que são as obras da carne são consentâneas a uma cultura de disputas, que faz jus a paz e união dos povos. Uma paz e união leviana e momentânea ou tranquilidade parcial proporcionada pela pós-modernidade, e discursos filosóficos-políticos e até religiosos, não deveria seduzir aos cristãos à paixão a tais eventos e esportes competitivos.
É até vergonhoso como um povo, cuja paz é real e genuína, pode se aliar a uma paz medíocre de alguns momentos. Convém salientar que o povo de Deus nunca dependeu de uma intervenção humana para convicções teológicas ou de fé prática, ou seja, não necessitávamos de uma intervenção para deixarmos de fazer o que Cristo há muito já havia nos disciplinado que não deveríamos nos entremeter.
Lembramos por exemplo, que não foi o Iluminismo com os pensadores franceses do séc. XVIII que desvincularam a fé cristã do Estado no Ocidente. Porquanto, na sucessão original da fé cristã, na pureza do Evangelho, esta nunca exerceu poder de Estado, pois a ele nunca se fundiu. O cristianismo, professo no Medievo, como o catolicismo e grupos da reforma, defenderam envolvimento na política, mas os cristãos, como os anabatistas do sec. XVI, nunca concordaram com tal coisa, pois a Igreja de Cristo sempre esteve isenta de associação com os reinos deste mundo e sua glória. E já deixo claro que é espúrio e muito esdrúxulo pensar que um crente anabatista tenha amor a tal paixão da copa e esportes competitivos. E a razão é muito simples: como alguém que se opõe ao guerrear e empunhar armas contra alguém, uma vez que tal coisa denota uma identidade com os poderes terrenos, esteja diametralmente imbuído de comprometimento com a glória de tal reino?
Quando há um embriago junto à adega do inimigo, se despreza um avivamento real, genuíno, e passa-se a apegar-se com o mundo e suas atrações e entretenimentos idólatras. Quando um povo despreza a voz do Espírito Santo, e inclusive ridiculariza o ser cheio com este mesmo Espírito Santo, se preenche o espaço com mundanismo e futilidades carnais. Deixar de ser cheio do Espírito Santo é um risco ao vinho alcoolizado que há na copa babilônica. Acredito piamente que os cristãos primitivos não sofreram por falta de esperteza, pois, em lugar de usarem táticas, tinham poder e vida dedicada ao Senhor Jesus suprimindo esperteza. Se tivessem desejo de glória e escapar os horrores que o mundo lhe impôs teriam condições para isso. Mas não ousavam, pois eram guiados pelo Senhor e não usavam a fé para criar um reino aqui, ou, como muitos pensam, transformar o mundo pela sua ascendência nas diversas camadas sociais.
Perceber a importância da doutrina chamada de Quiliasmo, milênio literal, ou seja, o Reino de Cristo sobre a terra como foi crido pela igreja, é indispensável, pois assim crendo estavam assegurados de que deveriam esperar seu Reino, mas não por sua investida com este século, se tornando uma igreja estatal. Obviamente que a doutrina do quiliasmo é amparada por sua coerência com a visão bíblica pré-tribulacionista, pois a igreja que há de ser arrebatada é aquela que esteve guardada da corrupção do mundo e levada para ser poupada da ira de Deus, e com sua ascendência ao reino consentâneo a sua condição santa, isto é, separada do mundo e virgem por não ter sido contaminada com os reinos daqui, uma vez que não recebeu galardão antecipado aqui, será a igreja que terá condições de reinar com Cristo por sua graça.
Por fim, resumimos nossas palavras em que o real avivamento traz consigo a renúncia do pecado, como no avivamento galês de 1904, em que os jogos, bebidas alcoólicas foram abandonadas tendo até o futebol americano sido esquecido por fãs e jogadores. Somente um avivamento salvará alguns do pecado de subirem o pódio dos envaidecidos. Somente um avivamento espiritual, que muitas vezes se pode ver choro, clamor, e obrigatoriamente confissão de pecados e arrependimento, estas coisas acontecem quando voltamos ao primeiro amor.

Roberval Soares de Oliveira
Membro da Igreja Batista Renovada Moriá em Fortaleza
Graduando em Licenciatura em Geografia pela UECE

Referências

BERCOT, David W. Que falem os primeiros cristãos: uma análise da igreja moderna sob a luz do cristianismo primitivo. Boituva: Literatura Monte Sião do Brasil, 2012;

DAVIS, John D. Novo Dicionário da Bíblia. São Paulo: Hagnos, 2005;

HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2008;

LUGT, Dan Vander. Afinal, o que está Satanás fazendo? Michigan: RBC Ministries, 2000;

O’REILLY, A. J. Os mártires do Coliseu. 8. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.


Um comentário:

  1. Essa segunda parte veio ainda melhor, tudo seja para o glórias e honras ao Senhor Jesus Cristo. parabéns mais uma vez para o jornal tocha da verdade, e graça ao nosso Deus pela deste servo do Senhor JESUS, que é o irmão Ruberval Soares.

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