sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

O Supremo, a porta dos fundos e o Evangelho

Há algumas semanas, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a exibição da sátira sobre Jesus gay por determinada plataforma de transmissão streaming, após julgamento em última instância do judiciário. A segunda turma, assim, acatou por unanimidade a reivindicação do canal em vistas de postulados constitucionais os quais valorizam a não-censura, a liberdade de expressão e os fundamentos da democracia, segundo o STF. Obviamente, grupos religiosos não acharam a decisão sensata e, por isso, manifestaram-se reagindo com críticas, justificadas, principalmente, pelos seus valores morais e sagrados da fé cristã que não permitem tratar o Cristo como o foi no filme. A grande questão, talvez, não seja a decisão em si, mas o que ela manifesta ou deixou de manifestar.

Segundo declarou o relator e ministro Gilmar Mendes: “retirar de circulação material apenas porque seu conteúdo desagrada parcela da população, ainda que majoritária, não encontra fundamento em uma sociedade democrática e pluralista como a brasileira”. Concluindo, disse: “Concluo que a obra Especial de Natal Porta dos Fundos não incita violência a grupos religiosos, mas constitui mera crítica realizada por meio de sátira, a elementos caros ao cristianismo. Por mais questionável que possa vir a ser a qualidade desta produção artística, não identifico em seu conteúdo fundamento que justifique qualquer tipo de ingerência estatal”.

Acreditamos que a questão não está apenas na exibição ou não do programa. Vai além! Há certo privilégio para a fomentação da ideologia de gênero que não vem respeitando ninguém (basta assistir ao filme) e que, contraditoriamente, reclama, em uma de suas bandeiras, o respeito pelas diferenças. Reforçamos que o propósito do Cristo foi sublime e está além de qualquer celeuma ideológica (mas Ele não precisa que o defendamos). Outro ponto digno de referência é a questão da desproporcionalidade, pois se um pregador censura a prática homossexual que faz parte de sua instrução bíblica, é logo taxado de homofóbico e fica sujeito a responder por crime de discriminação (como querem muitos movimentos sociais ao apelarem para as autoridades). A pregação, contudo, não carrega em si um tom de rejeição nem compactua com a violência que certos indivíduos lgbts têm sofrido. A pregação singular do Evangelho é de boas novas, sendo sua essência promover a ideia de liberdade dos grilhões do pecado para uma nova vida em Cristo, visto que todos os homens caíram em desgraça e carecem das dádivas divinas através da profissão de fé. É uma mensagem de não violência, mesmo que a mídia tente inserir pelo seu processo massificador o contrário.

Mas, vejamos, para o primeiro, a arte cinematográfica, muito embora bastante carente de criatividade e daquela sacada de boas produções, recebe consideração mais elevada do que a doutrina cristã, mesmo que essa se demonstre transformadora de vidas e manifeste a superação de situações que foram esquecidas pelo Estado, mas por força da atividade eclesiástica, indivíduos receberam acolhimento para redirecionarem suas vidas e transformá-las. A cultura moral do Evangelho, se podemos chamar assim, reflete o ponto de equilíbrio onde os sujeitos devem estar para tornar a vida em sociedade, da mesma forma, equilibrada. Com o avanço dos “quereres” (certamente outra palavra para ilustrar ou desmistificar a volúpia do ego humano), pois “querer é poder” na atual conjuntura, as mais íntimas paixões tem erupcionado, provocando uma quebra dos valores que regem a conduta humana. Imagine daqui a alguns anos se isto continuar a acontecer: políticos corruptos serão ovacionados e tidos como heróis; estupradores e pedófilos serão os ousados e os desbravadores. Alguém pode até dizer que isso jamais acontecerá ou é retórica exagerada, mas olhando para a onda de reinvenção do homem contemporâneo não duvidamos de nada!

Enfim, para sociedade na qual vivemos o errado, o desvio de padrão, o amoral e tantos outros conceitos semelhantes ganham prevalência. Essa mesma sociedade, sobretudo, achando-se portadora da luz nietzschiana sufoca a verdade tentando esquecê-la. Realmente, uma decisão como esta só dá pra sair mesmo se for pela porta dos fundos.    


Nenhum comentário:

Postar um comentário