segunda-feira, 25 de abril de 2011

O MATRIMÔNIO E O SEXO

“Honrado seja entre todos o matrimônio e o leito sem mácula; porém, aos que se dão à prostituição, e aos adúlteros, Deus os julgará.” (Hebreus 13: 4)

No texto citado acima, o escritor da carta aos hebreus faz uma nítida separação entre o matrimônio e o leito sem mácula, sendo o primeiro uma condição necessária para o segundo. O matrimônio é um pacto reconhecido publicamente diante dos homens e de Deus, pelo qual um homem e uma mulher resolvem compartilhar as suas vidas até a morte, criando os filhos, gerados desse enlace, para Deus. A união física que se segue está em relação dialética com o matrimônio, ou seja, o matrimônio é pressuposto de sua pureza enquanto ela é o selo que efetiva o matrimônio.

“Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à SUA mulher, e serão ambos UMA CARNE”(Gênesis 2: 24).

Em verdade, o casamento não é um simples contrato sujeito a distrato ou mera associação superficial, como na nossa sociedade secularizada se pretende apresentá-lo, mas antes, é uma fusão transcendental, uma instituição divina. Visto o casamento como mero contrato, os cônjuges estariam livres para estabelecer os seus termos (condições) e fins (objetivos), que não satisfeitos dariam ensejo ao distrato (divórcio). No entanto, quando se concebe o casamento como uma instituição, vê-se que ele existia abstratamente como um modelo (arquétipo), antes mesmo do enlace efetivo entre as duas pessoas que o concretizam, como uma verdadeira ordenação divina com estrutura e fins definidos por Deus.

Quando os cônjuges entendem o casamento como uma mera reciprocidade de expectativas condicionada, o simples egoísmo de um deles pode ensejar prejuízos enormes, mas, quando se enxerga pelo modo bíblico que o bom relacionamento entre os casais é na verdade apenas uma condição para a realização do fim primordial do casamento, o qual está ligado aos filhos ou à família como ente institucional, então o egoísmo tem que ser sepultado. Assim, como há um sentimento patriótico que une uma nação apesar das divergências, é preciso existir um sentimento familiar que revele a importância do lar e a irracionalidade de sua divisão (Mateus 12 : 25).

O fim principal do casamento é a procriação e educação dos filhos para Deus, os outros são fins secundários (mútuo auxílio, regulação dos impulsos sexuais, etc). Os fins secundários, entretanto, nunca podem ir de encontro ao fim principal. A unidade institucional do casamento se estabelece pela submissão dos filhos aos pais, pela submissão da esposa ao esposo e pela submissão do esposo aos fins do casamento definidos por Deus através da Escritura.

No princípio, Deus estabeleceu o sexo para a procriação da espécie (Gênesis 1: 27 e 28). O sexo faz parte da dimensão animal do ser humano, tanto que não subsistirá na eternidade (Marcos 12 : 25), e nós sabemos que entre os animais sexo é apenas para a procriação da espécie. Entretanto, a queda gerou no homem a sensualidade (Gênesis 3: 7), razão porque após a queda, o sexo no casamento, passou a ser também um moderador dos impulsos sexuais, além de meio de procriação (I Cor. 7 : 2, 9).

João Calvino, o teólogo da Reforma Protestante, assim se expressou:

“Mas alguém dirá: ‘A cura da incontinência é a única razão para se contrair o matrimônio?’. Minha resposta é que isto não é o que Paulo pretende dizer. Pois aos que têm o dom de ser capazes de suprimir o matrimônio, ele dá a liberdade de se casarem ou não. Mas ele ordena aos demais a que ponham bastante atenção em suas fraquezas, ao se casarem. O que importa é o seguinte: o que está em jogo aqui não são as razões pelas quais o matrimônio foi instituído, e, sim, as pessoas para quem ele é indispensável. Porque, se atentarmos para o primeiro matrimônio, perceberemos que ele não podia ser um antídoto contra uma doença, a qual ainda não existia, senão que foi instituído para a procriação de filhos. É verdade que, depois da Queda, este outro propósito foi acrescido.”

(Comentários a I Cor. 7).

“....Este é o modo como Agostinho trata do assunto, e por sinal muito bem, em seu livro ‘Das Vantagens do Matrimônio’, e às vezes em outras partes. Pode-se sumariá-lo como segue: o ato sexual entre esposo e esposa é algo puro, é legítimo e santo: porque é uma instituição divina. A paixão incontrolável com que os homens são inflamados é um vício oriundo da corrupção da natureza humana; mas, para os crentes, o matrimônio é um véu que cobre essas falhas, de modo que Deus não mais as vê.” (Comentários a I Cor. 7)

Martinho Lutero também afirmou:

“...É importante obedecer à ordem e ao mandamento de Deus por amor da propagação da raça. E mesmo que isto não fosse um motivo para o casamento, deveríamos lembrar que ele é um remédio contra o pecado e uma defesa contra a devassidão” (Comentários sobre o salmo 127)

Diante do exposto, talvez alguém me replique: o sexo também não é uma manifestação de amor?. A resposta seria sim e não. O sexo não foi criado como uma expressão exclusiva ou insubstituível de amor, mas foi criado para procriação e, posteriormente, passou a servir, no casamento, também para regular os impulsos sexuais. Todavia, devemos lembrar que o homem é também espírito e, ao contrário dos animais, tem o poder de espiritualizar tudo o que faz. Assim, o homem deve espiritualizar o sexo, fazendo dele uma manifestação de amor, humanizando-o, colocando-o a dimensões mais elevadas. Um olhar, um beijo, um abraço e infinitos outros gestos e ações podem ser as mais altas expressões de amor. É exatamente por isso que ninguém pode deixar o seu cônjuge, alegando que com ele não se satisfaz plenamente do ponto de vista sexual; nem dizer que, em razão da existência de uma enfermidade do cônjuge que impossibilite a vida sexual, o relacionamento conjugal estará prejudicado para sempre. Sobre isso, pronuncia-se João Calvino:

“...Depois disso, é o Senhor mesmo quem deve refrear e restringir-nos por meio de seu Espírito, mesmo se as coisas não vão tão bem quanto gostaríamos. Pois se uma esposa cai por um longo tempo em infindável enfermidade, nem por isso o esposo é justificado em buscar outra esposa. Semelhantemente, se após o casamento o esposo começa a sofrer de alguma enfermidade, a esposa não pode, sobre esta base, fazer repentina transição para outro estado....Tendo entrado na vida conjugal, tenhamos esperanças de que ela nos será de grande valia, se, ao contrário de nossas expectativas, as coisas se desandarem” ( Comentários a I Cor. 7).

Do que foi falado até aqui, vê-se que é um pecado contra o casamento o uso de anticoncepcionais artificiais. Os métodos naturais (tabela, etc) não são pecaminosos, pois consistem no controle da natalidade pela abstinência. No caso, as relações sexuais no casamento seriam naturais e, por serem no período de provável infertilidade, visariam apenas a moderação do impulso sexual, ou então, se apresentariam como uma manifestação de afeto. Lembramos, entretanto, que a supressão total de filhos de modo voluntário é pecaminosa por ir de encontro ao fim primordial do casamento. No caso, do uso dos anticoncepcionais artificiais, a pessoa não controla a intensidade das relações íntimas, mas procura impedir delas o resultado natural, a procriação, ou seja, as relações sexuais são utilizadas unicamente para a moderação do apetite sexual, como se esse fosse o objetivo principal do casamento, em ofensa direta à fertilidade natural e aos fins primordiais do casamento: a procriação da espécie e o estabelecimento da família.

A ligadura de trompas então, é uma afronta direta ao Todo-poderoso, principalmente levando-se em conta que a fertilidade é considerada na Bíblia como uma bênção de Deus (Êxodo 23 : 25, 26; Salmo 127 : 3; Salmo 128 : 3, 4).

Resta ainda uma questão : Se o fim primordial do casamento é a perpetuação da espécie e a constituição da família, sendo a moderação dos impulsos físicos pelo sexo uma mera concessão que passou a existir depois da queda, seria permitido, então, àquele casal que já gerou filhos abster-se definitivamente do sexo?

A pergunta acima estabelecida é de salutar importância por duas razões. Em primeiro lugar, porque assim como um solteiro pode sublimar os impulsos sexuais, um casal também o pode. Em segundo lugar, porque a prática mencionada na questão era muito comum na Igreja Antiga, sendo validada inclusive pelos pais da Igreja e regulamentada pelos cânones antigos.

Os antigos cânones da Igreja proibiam ao esposo negar-se a sua esposa contra sua vontade sob o pretexto de castidade, semelhantemente à esposa a negar seu corpo ao esposo. Mas permitia que vivessem juntos, após procriação, em perene celibato, desde que houvesse concordância. Essa posição é perfeitamente bíblica.

Alguns poderão contestar a posição acertada da Igreja antiga, citando o que se contém em I Cor. 7:5 que diz : “Não vos priveis um ao outro, senão por consentimento mútuo, por algum tempo, para vos aplicardes ao jejum e à oração; e depois ajuntai-vos outra vez, para que Satanás não vos tente pela vossa incontinência”. Esta passagem, entretanto, precisa ser visto no seu contexto, senão vejamos:

(1) Paulo está escrevendo uma carta a uma igreja específica, considerando suas fraquezas próprias, por isso, ele abre muitas concessões aos seus conselhos, considerando a imoralidade reinante ( I Cor. 7 : 1, 2; 7 : 8, 9);

(2) Em I Cor. 7: 5, Paulo não está condenando a perene abstinência, mas recomendando que os casais cristãos de Corinto, em face da imoralidade reinante, só se abstivessem (de comum acordo entre marido e mulher) se fosse com o compromisso de se dedicarem a oração e ao jejum, voltando a ajuntar-se outra vez, não porque fosse pecado a abstinência, mas para que Satanás não os tentasse. No versículo seguinte (v. 6), Paulo mostra estar dando apenas um conselho : “Digo, porém, isto como que por permissão e não por mandamento”;

(3) Nós sabemos que, por causa de uma enfermidade, a abstinência pode se tornar necessária e, depois de uma certa idade, temos a falta de abstinência como um descontrole pecaminoso;

(4) Paulo diz que a prestação sexual do homem é um direito exigível da mulher e a prestação sexual da mulher um direito exigível do homem (I Cor. 7: 3 e 4). Ora, ninguém pode renunciar a sua obrigação, mas cada um pode renunciar ao seu direito;

(5) Colocamos, por fim, a título de observação, que a pessoa repudiada por cometimento de adultério, no caso de não haver possibilidade de restauração do matrimônio, não pode contrair novas núpcias, devendo ficar abstinente para sempre (Mateus 19:9). Do mesmo modo, aquele que deixou seu cônjuge por algum outro motivo que não a infidelidade dele, não poderá contrair novo casamento, mas deve voltar a ele ou permanecer só e abstinente (I Cor. 7: 10 e 11).

Na primeira carta aos coríntios, Paulo recomenda o celibato, dizendo: “E bem quisera eu que estivésseis sem cuidado. O solteiro cuida das coisas do Senhor, em como há de agradar ao Senhor; mas o que é casado cuida das coisas do mundo, em como há de agradar à mulher” (I Cor. 7:32, 33). Vide os versículos 34 e 35.

A primeira vista, o estado matrimonial seria necessariamente inferior ao do celibato, mas convém aqui algumas observações. Paulo está fazendo um juízo de fato e não de valor. Paulo não está dizendo que, pelo casamento, os homens deveriam se distrair do cuidado das coisas do Senhor, mas dizendo que, em decorrência da natureza pecaminosa, normalmente acontece e pode ser observado: os cônjuges, seduzidos pelo egoísmo, querendo cada um absorver a atenção do outro, gerando as “tribulações na carne” mencionadas em I Cor. 7 : 28. Por outro lado, Paulo assinala que há exceções quando fala de mulheres santificando os maridos para Deus e maridos santificando suas esposas ( I Cor. 7 : 14).

Quando o apóstolo fala que os casados cuidam das coisas do mundo, ele está querendo observar que eles mais facilmente são cativados para a vida social intensa, com toda a sua futilidade. João Calvino entende do seguinte modo: “...se relacionam com circunstâncias prazenteiras, tais como as frivolidades de uma recepção de núpcias, os momentos de diversões, e outras coisas que a vida conjugal tem de atender”. Entretanto, além do crente evitar programações inúteis, ele pode aproveitar certas oportunidades para evangelizar, e ainda tornar o lazer da família maximamente marcado pela presença da Palavra de Deus. O remédio geral, entretanto, dado por Paulo é o que segue: “Isto, porém, vos digo, irmãos, que o tempo se abrevia; o que resta é que também os que têm mulheres sejam como se não as tivessem; e os que choram, como se não chorassem; e os que folgam, como se não folgassem; e os que compram, como se não possuíssem; e os que usam deste mundo, como se dele não abusassem, porque a aparência deste mundo passa.” (I Cor. 7: 29 – 31).

A história nos fala de casamentos que glorificaram a Deus, como o de Lutero e o de Jonathan Edwards.

Lutero casou-se com a ex-freira, Catarina von Bora. Durante as refeições, a sua casa ficava cheia de estudantes que vinham participar do alimento e aprender teologia à mesa. Lutero, em seu lar, ensinava o catecismo não apenas para os seus filhos, mas para muitas crianças da Igreja. Catarina apoiou Lutero em todas as suas atividades como reformador, pastor, teólogo, escritor, professor, músico e compositor. Era estimada por todos. Administrava sabiamente o lar, enquanto Lutero exercia suas atividades. Orlando Boyer escreveu sobre Lutero e sua esposa:

“Havia entre Lutero e sua esposa profundo amor de um para com o outro. São de Lutero estas palavras: ‘sou rico, Deus me deu a minha freira e três filhos, não me importo das dívidas: Catarina paga tudo’....nas suas meditações sobre as Escrituras, muitas vezes se esquecia das refeições. Ao escrever o comentário sobre o salmo 23, passou três dias no quarto comendo somente pão e sal. Quando a esposa chamou um serralheiro e quebraram a fechadura, acharam-no escrevendo, mergulhado em pensamentos e esquecido de tudo em redor”.

Jonathan Edwards foi pastor e avivalista, teólogo e filósofo, escritor e professor, além de presidente de uma Universidade. A sua esposa, como ele, era dotada de um intelecto privilegiado e disciplinada na leitura. Jonathan Edwards conservou até o fim da vida, o hábito que adquiriu quando criança: o de isolar-se para “buscar contemplação divina e oração”. Foi numa dessa ocasiões, em 1737, que ele teve uma das mais surpreendentes de suas experiências espirituais, na qual lhe veio uma profunda revelação de Cristo como Mediador e do Espírito Santo como Santificador. A sua esposa também ficou conhecida por ter tido experiências semelhantes. Orlando Boyer afirma o seguinte:

“Aos vinte e quatro anos casou-se com Sara Pierrepont, filha de um pastor, e desse enlace nasceram, como na família do pai de Edwards, onze filhos.

Ao lado de Jônatas Edwards, no Grande Despertamento, estava o nome de Sara Edwards, sua fiel esposa e ajudadora em tudo. Como seu marido, ela nos serviu de exemplo de rara intelectualidade. Profundamente estudiosa, inteiramente entregue ao serviço a Deus, ela era conhecida por sua santa dedicação ao lar, pelo modo de criar seus filhos e pela economia que praticava, movida pelas palavras de Cristo: ‘para que nada se perca’. Mas, antes de tudo, tanto ela como seu marido eram conhecidos por suas experiências em oração. Faz-se menção destacada especialmente de um período de três anos, durante o qual, apesar de gozar de perfeita saúde, ficava repetidas vezes sem forças, por causa das revelações do céu. A sua vida inteira foi de intenso gozo no Senhor.

Jônatas Edwards costumava passar treze horas, todos os dias, estudanto e orando. Sua esposa, também, diariamente o acompanhava na oração. Depois da última refeição, ele deixava toda a lida, a fim de passar uma hora com a família”

Sobre os relatos do avivalista acerca da esposa, comenta Lloyd-Jones:

“...Ele nos faz um extenso relato de uma das admiráveis experiências que sobrevieram a sua esposa. A esposa de Jonathan Edwards foi uma pessoa santa como o próprio Edwards, e ela tem algumas experiências quase incríveis. Ele nos dá um relato delas e as examina”.

Rev. Glauco Barreira Magalhães Filho
(membro do Presbitério Anabatista da Igreja em Fortaleza)

A Ciência do Amor de Deus

Certa vez, quando meditava em um texto bíblico, pude perceber uma das virtudes mais deslumbrantes do Senhor. Deus falava ao seu povo, Israel, manifestando seu veemente amor e mostrando o quanto eles eram queridos. A demonstração deste amor é comprovada nos mais diversos acontecimentos daquela gente. O grande El-Shadai livrou-os das mãos de faraó no Egito (Ex 12:41), sustentou-lhes durante sua peregrinação no deserto (Ex 16:12-15), deu vitória diante das nações que circundavam toda a região de Canaã (Js 24:11) e estabeleceu a menina dos seus olhos na terra prometida (Js 24:8).

Noutra ocasião, aquela abençoada nação de Deus foi parar nas campinas de Moabe, nas possessões do rei Balaque. Este já tinha ouvido falar acerca dos poderosos feitos do Senhor e, pressentindo o que estava para lhe acontecer conclamou os midianitas contra os judeus, enviou mensageiros a Balaão, um profeta respeitado e mui renomado, convocando-o para profetizar contra os israelitas. Deus interveio convertendo o mal em bem.

O texto de Deuteronômio 23:5, foi o início de nossa meditação, veja: “Porém o Senhor teu Deus não quis ouvir Balaão; antes o Senhor teu Deus trocou em bênção a maldição; porquanto o Senhor teu Deus te amava”.

O amor de Deus continua sendo uma evidência sublime de seu cuidado, pois se nos aprofundarmos um pouco mais na história dos hebreus, logo, constataremos que não houve um só momento de desprezo por parte do Senhor Deus. O povo inseguro perdurou em certos momentos com sentimento de escravidão deixando-se levar pelas lembranças infrutuosas de um passado ainda recente no Egito. Por estarem no deserto reclamavam a falta de pão, murmuravam por não terem carne e às vezes nem água. Percebemos com isto a insensibilidade de Israel. Não expressavam respeito nem honra a Deus. Porém, diante de toda esta oposição, Deus continuava sendo fiel. A multidão daqueles que seguiam a Moisés não davam a Deus o devido tributo desprezavam Seu amor. Seu juramento redigido no início do livro bíblico nos faz entender o sentimento divino: “Mas, porque o Senhor vos amava, e para guardar o juramento que fizera a vossos pais...” (Dt 7:8a).

A essência de Deus é o amor. Encontramos a fluência dele na trindade antes mesmo de existir o mundo. O Pai ama o Filho, o Filho ama o Espírito, o Espírito ama o Pai. É uma característica peculiar do Senhor, daí o versículo dizer que Ele os amava. Sendo assim, também podemos comprovar que seu amor é ilimitado, pois por ele o homem foi alcançado.

Mas, passando pelos patriarcas, Abrãao, Isaque e Jacó, entenderemos a expansão e o porque de Deus amar aquele povo. Abraão, pai da nação judaica, quando contemplado em Gênesis 11 e 12 foi achado como um homem de pura devoção ao Deus verdadeiro: “E achaste o seu coração fiel perante ti, e fizeste com ele a aliança...” (Ne 9:8). Deus percebeu que Abraão além de amá-lo demonstrava piedade e testemunho persuasivo para que outros se sentissem incentivados a amar a Deus. Não que isto venha a ser uma carência demasiada de Deus, mas simplesmente o desejo de reconhecimento do Criador diante de suas criaturas. Ele, buscando um perfeito modelo para figurar tal faculdade, utilizou-se de Abraão. Primeiramente, ordenou-lhe sair do meio de sua família, que estava entre os caldeus, povo idólatra da cidade de Ur, para que pudesse sem impedimento algum honrá-lo e adorá-lo. Abraão fez o papel de um genuíno servo, entregando tudo nas mãos do Senhor Deus, porque o amava e, incondicionalmente, confiava nos propósitos divinos. O apóstolo Paulo quando mencionou a fé deste homem chamou-o de bendito, assim como são aqueles que praticam a mesma fé (Gl 3:9). Sim, havia entre Deus e Abraão uma recíproca amizade de ágape (perfeito amor). O Senhor, pelo exemplo de tão brilhante servo, esperava e dava condições aos seus filhos, netos, bisnetos (...) de encontrarem Nele o mesmo apego. Infelizmente, isto foi raramente protagonizado pela descendência de Abraão.

A orientação de amá-lo, além de estar contida no decálogo, é parte integrante de muitos outros trechos dos evangelhos e cartas apostólicas. Em II Tessalonicenses 3:5, Paulo torna claro que Deus (Jesus) é quem orienta nossos corações em seu amor: “Ora o Senhor encaminhe os vossos corações no amor de Deus...”. Por Ele somos dirigidos a compreender perfeitamente o real sentido de amá-lo e evidenciaremos bem esta afinidade por Ele mesmo. A proximidade com o Senhor nos levará aos bons costumes, as reflexões alicerçadas na Palavra e as tendências puras. Quando muitos assim viverem caminharemos para a perfeição em comunhão e em conformidade com o Pai que a tudo ilumina.

Conscientes desta experiência, temos de Deus um incentivo a mais para vivermos uma vida santificada, equilibrada, perseverante. Quando vejo pessoas que um dia estiveram entre o povo de Deus e hoje retornaram às velhas práticas, fico a pensar que elas jamais sentiram este amor por Deus. Como também não se sentiram amadas por Ele, saíram do nosso meio. Culpa de Deus? Claro que não! O amor proporcionado por Deus é algo maravilhoso, causa uma experiência irreversível. Por isso afirmo sem medo: estas pessoas não compreenderam a dádiva divina, pois a percepção dela nos impulsiona a tributar-lhe nossa vida, ocorrendo, assim, uma obediência espontânea. É o que mostra o apóstolo Paulo em II Co 5:14 quando alude nesta linha de pensamento sobre os efeitos do seu amor: “Porque o amor de Cristo nos constrange...”. Por isso, reafirmo acerca da necessidade de haver uma conscientização, subjugada à experiência no Espírito pela Palavra. Sem ela não se pode discernir tal amor, e como conseqüência não poderemos deleitarmo-nos como filhos diante do Altíssimo.

O apóstolo João, considerando talvez a indagação de muitos quando não entendem o que nos move a submeter-nos às ordens divinas, falou cheio do Espírito: “Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; e os seus mandamentos não são pesados” (I João 5:3) Quem ama a Deus tem prazer na vida casta. Não é algo estranho, pelo contrário, é uma normalidade para o crente reconhecer a Deus e perfazer seus anseios.

Fomos constituídos “geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (I Pe 2:9) para dar provas deste enlace. A primeira nação desprezou a Deus de fato e verdade. Hoje podemos chamá-lo de Aba (Paizinho) que denota uma afinidade bem estreita. Além do mais, não temos certas dificuldades que havia no Antigo Testamento, “temos um novo e vivo caminho que Ele nos consagrou além do véu” (Hb 10:20). Com maior facilidade podemos usufruir de uma permanente comunhão com Deus através de seu Santo Espírito. Noutras palavras, nenhum crente pode reclamar de não ter incentivo algum para amar a Deus. Tudo o que é possível foi-lhe concedido objetivando sua utilização. O problema de muitos cristãos é viverem uma vida sedentária, simplesmente, engavetando tal dom.

Pelo o exemplo de vida de Filemon podemos confirmar ainda mais nossas poucas palavras. O apóstolo Paulo direcionando uma carta a ele, afirmou: “Graças dou ao meu Deus, lembrando-me sempre de ti nas minhas orações; Ouvindo do teu amor e da fé que tens para com o Senhor Jesus Cristo, e para com todos os santos” (Fm 4-5). Filemon apesar de ser mencionado tão brevemente, nos proporciona condições de entender que o amor de Deus, como aqui mencionado, não é direito apenas dos maiores vultos bíblicos. Às vezes pensamos que os grandes personagens bíblicos tiveram experiências muito mais abundantes que os demais. Mas isto não é verdade! Deus atinge-nos igualmente. Vemos que tal dom era um selo vistoso na vida de Filemon, pois ele era conhecido pela vida de fé e amor a Deus.

É apreciável por demais o exercício constante deste discípulo de Jesus na prática da comunhão com o Pai. Desta forma, pude lembrar-me de um dos tantos problemas dos eleitos; apesar de ser o oposto da nossa proposição vale a pena ser mencionado: Quando não se tem constância nem intensificação espiritual acabamos por constatar uma vida infrutífera, cheia de mazelas contaminando e empobrecendo o vaso que deveria ser trabalhado apenas pelo Fiel Oleiro. Mas, Filemon tinha a experiência que lhe proporcionava a confirmação da frase apostólica: “E nós conhecemos, e cremos no amor que Deus nos tem. Deus é amor; e quem está em amor está em Deus, e Deus nele” (I João 4:16).

Finalizo nosso comentário com uma das expressões mais belas que pude ler em toda minha vida. Uma citação de Richard Baxter, puritano, e homem convicto no amor divino: “É coisa pequena a teus olhos ser amado de Deus? ...cristão, crê nisto e pensa nisto. Serás eternamente seguro nos braços daquele amor que foi desde sempre e se estenderá pela eternidade”.

Pastor Heládio Santos
Membro do Presbitério Anabatista da Igreja em Fortaleza

SEPARADOS DO MUNDO

E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus (Rm 12:2).

Alguém já disse que a igreja é como um barco no mar do mundo, pois assim como o barco deve estar na água, mas ela não deve entrar no barco, o que poderia ocasionar o seu afundamento, assim também o crente está no mundo, mas não pode ser influenciado por ele.

A cultura de um povo é a projeção de seus valores sobre os objetos. Não podemos, então, esperar que uma cultura, principalmente a nossa, deixe de ser uma túnica manchada pelo pecado (Judas 23). Vivemos em meio a uma geração cuja postura ideológico-filosófica relativiza a moral, o certo e o errado, consagrando a ética subjetiva e situacional, construída existencialmente por cada um em particular. Esta falta de padrão universal de apreciação manifesta-se na arte expressionista, nas pinturas de significação obscura, em que cada um pode ver uma coisa diferente.

O homossexualismo é visto como opção de liberdade, daí a luta pelo “casamento” de gays, e o surgimento da moda que põe roupa de homem na mulher e roupa de mulher no homem, além de propagação do uso de roupas indefinidas como a saia-calça. As mulheres passam a ter cabelo curto, enquanto os homens a ter cabelo comprido.

O alcoólatra é visto apenas como um doente que precisa ser tratado e não como um pecador que precisa se arrepender para ser libertado por Deus. O homem é considerado um ser sem alma imortal, um mero produto da evolução, um amontoado de sensações e impulsos, daí porque considera-se a vida “expressiva” e sem restrições como sendo a vida feliz, o que resulta na libertinagem sexual, além do uso de roupas indecentes, músicas e danças sensuais.

As músicas mundanas, a moda, o ensino educacional, grande parte da literatura e dos programas de televisão estão afetados pelo pecado, compondo a grande estrutura maligna chamada na Bíblia de mundo (I João 5: 19). A igreja, de certo modo, deve ser uma contra-cultura, deve nadar contra a correnteza. Isso não quer dizer, entretanto, que não podemos acolher certos elementos moralmente não comprometidos de nossa cultura (I Cor. 7: 31). Isso, entretanto, não é uma sugestão para o isolamento, mas antes, é um desafio a que sejamos luminares no meio das trevas, como ovelhas no meio de lobos, tendo o viver honesto entre os gentios (I Pedro 2: 12).

Eis o que Jesus queria mostrar aos discípulos quando lavou-lhes os pés. Nós precisamos ser lavados constantemente pela Palavra de Deus, porque estamos no mundo, “pisamos e andamos na terra”, correndo o risco de ter sujo os “pés”: Disse-lhes Jesus: Aquele que está lavado não necessita de lavar senão os pés, pois no mais todo está limpo (João 13:10). Precisamos ser continuamente podados pela Palavra de Deus (João 15:2,3).

A Bíblia diz em Romanos 12:2 que não devemos nos conformar com esse mundo. O mundo está ao nosso redor como um rio de forte correnteza e tenta nos impor a sua forma, de fora para dentro, impedindo a liberdade interior. Os homens não se apercebem que os meios de comunicação e o sistema educacional lhes dita como devem viver, determina-lhes uma cosmovisão. O incrédulo, morto espiritualmente, oco por dentro, não tem outra opção senão a de seguir o que a Escritura chama de curso deste mundo (Efésios 2:1). O crente, entretanto, foi espiritualmente vivificado e tem a palavra viva de Deus dentro de si (I Pedro 1: 23). O crente, portanto, não deve se conformar com este mundo, mas deve ser transformado pela palavra interior. Ser transformado é mudar de forma, transcendendo ou transpondo a outra. O crente não foge do mundo como os monges, mas, antes, vence o mundo por sua fé ( I João 5:4, 5). Ser transformado é ser modelado de dentro para fora pela Palavra de Deus (João 7: 38) e, logo, é ser livre (II Cor. 3: 17).

O crente não deve ser formado pelos falsos valores deste mundo, embora não deixe de conhecê-los, inclusive para refutá-los. O crente deve ser moldado pela palavra interior. É a Palavra de Deus quem nos separa do mundo:

Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do mundo, como eu do mundo não sou. Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade (João 17:14-17).

O crente deve ser diferente do mundo e suficientemente autêntico para suportar a hostilidade dos que não temem a Deus. John Bunyan, na sua alegoria intitulada O Peregrino, registra a passagem de Cristão e Fiel pela feira das vaidades:

Primeiro, os peregrinos trajavam vestes muito diferentes daquelas usadas por qualquer um dos que negociava na feira. Por conseguinte, as pessoas da feira não tiravam os olhos deles. Alguns diziam que eram idiotas, outros que eram lunáticos mendicantes, outros ainda, bárbaros estrangeiros.

O mundo cria “máscaras” para as pessoas de tal maneira que elas valem não pelo que são, mas pela “máscara” que usam. Chamam essas “máscaras” de status social. Assim o mundo aliena as pessoas de si mesmas, escondendo-as atrás de disfarces. O mundo divide os homens. Quando nos convertemos somos espiritualmente inclusos em Cristo e dele revestidos. Apesar de termos diferentes funções no corpo de Cristo, somos todos iguais no Senhor:

Porque quantos fostes batizados em Cristo já vos revestistes de Cristo. Nisto não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus (Gálatas 3:27,28).

Para sermos inclusos em Cristo pela fé temos que renunciar o mundo e, logo, suas divisões artificiais (Filipenses 3:4-9). Paulo adverte que não podemos andar segundo os homens (I Co 3:3). Tiago diz:

Meus irmãos, não tenhais a fé de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória, em acepção de pessoas. Porque, se no vosso ajuntamento entrar algum homem com anel de ouro no dedo, com trajes preciosos, e entrar também algum pobre com sórdido traje, e atentardes para o que traz o traje precioso, e lhe disserdes: Assenta-te tu aqui num lugar de honra, e disserdes ao pobre: Tu, fica aí em pé, ou assenta-te abaixo do meu estrado, porventura não fizestes distinção entre vós mesmos, e não vos fizestes juizes de maus pensamentos? Ouvi, meus amados irmãos: porventura não escolheu Deus aos pobres deste mundo para serem ricos na fé, e herdeiros do reino que prometeu aos que o amam? Mas vós desonrastes o pobre. Porventura não vos oprimem os ricos, e não vos arrastam aos tribunais? Porventura não blasfemam eles o bom nome que sobre vós foi invocado? (Tiago 2:1-7)

Em Romanos 12:2, conforme já vimos, Paulo diz que não devemos nos conformar com o mundo. O versículo de número um, entretanto, fala que devemos apresentar a Deus as nossas vidas como culto verdadeiro. O texto sugere, em outras palavras, que quem se conforma ao mundo se entrega a ele e, logo, lhe presta culto, cai em idolatria. Tiago tem um raciocínio semelhante na sua epístola (Tiago 4:4-5). Ora, o modo mais evidente em se conformar com o mundo é seguir as imposições sensuais e altivas da moda. Em seu livro O Banquete, escrito em forma de diálogo, o famoso filósofo dinamarquês, Kierkegaard, traz o seguinte, no discurso de alfaiate, um personagem fictício, sobre a mulher:

...a moda é uma hipócrita exposição da indecência, autorizada porque respeita as conveniências... me sacrifico para ser o sumo sacerdote no culto desse ídolo... A mulher quer sempre estar na moda, constantemente; não pensa em outra coisa. A mulher é muito espirituosa, mas emprega tão mal o seu espírito como o filho pródigo emprega o dinheiro... nada há, por mais sagrado que lhe pareça, que não reduza às dimensões do mero enfeite de que a moda é a expressão por excelência; e não devemos estranhar que ela assim pense, porque a moda é para ela sagrada... A mulher veste-se à moda para atrair a atenção das outras mulheres, e sabe ver, num lance de olhos, se está ou não a ser observada e admirada... saiba ele (o homem) que a mulher não lhe pertence, como não pertence a outro homem qualquer; a mulher está dominada por esse fantasma que surgiu do monstruoso comércio da reflexão feminina consigo própria: a moda. A mulher deveria ser obrigada a jurar pela moda, para que os seus juramentos pudessem ser tidos por verdadeiros; porque a moda é objeto constante dos seus pensamentos, e tema que está sempre em relação com todos os outros assuntos de que se ocupe... Se alguma vez eu descobrir uma moça cuja modéstia humilde não tenha sido ainda corrompida pela indecente frequentação da sociedade feminina, farei o possível por que ela caia. Atraí-la-ei às minhas redes, e, depois de presa, levá-la-ei ao lugar de sacrifício, quero dizer à minha loja de modas... Quando ela parecer mais louca do que uma internada em hospital de alienados, ou ainda mais extravagante, a ponto de nem sequer ser admitida no hospital, então poderá sair da minha casa; está encantada; porque está encantada, nenhum homem, nenhum deus, conseguirá agora atemorizá-la; é que ela agora... está na moda... Se a mulher tudo reduziu e referiu à moda, quero eu prostituí-la graças à moda, como ela merece; não tenho tréguas, eu, alfaiate; a minha alma ferve só de pensar na minha tarefa; quero que a mulher acabe por se mostrar de brincos na ponta do nariz...

Jesus disse que tínhamos que ser como as crianças para entrar no Reino de Deus. Uma das características da criança é que ela valoriza os outros pelo que eles são, pois ela ainda não está a par das máscaras sociais (status). Quando uma criança discrimina pessoas, o faz porque foi influenciada por um adulto ou porque confunde o feio com o mau por não discernir entre a intuição ética e a intuição estética.

No livro O Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry está escrito:

Se lhes dou detalhes sobre o asteróide B 612 e lhes confio o seu número, é por causa das pessoas grandes. As pessoas grandes adoram os números. Quando a gente lhes fala de um novo amigo, elas jamais se informam do essencial. Não pergunta nunca: ‘Qual é o som da sua voz? Quais os brinquedos que prefere? Será que ele coleciona borboletas?’ Mas perguntam: ‘Qual a sua idade? Quantos irmãos tem ele? Quanto pesa? Quanto ganha seu pai?’ Somente então é que elas julgam conhecê-lo. Se dizemos às pessoas grandes: ‘Vi uma bela casa de tijolos cor-de-rosa, gerânios na janela, pombas no telhado...’ elas não conseguem, de modo nenhum, fazer uma idéia da casa. É preciso dizer-lhes: ‘Vi uma casa de seiscentos contos’. Então elas exclamam: ‘Que beleza!’.

São as divisões artificiais (máscaras sociais) que fazem aflorar o orgulho (“não é próprio da minha posição fazer uma atividade servil assim!”) e as lisonjas hipócritas. Como os ricos sempre tiveram uma “máscara” de elevada significação no mundo, Jesus disse que dificilmente um rico entraria no Reino de Deus, pois ele teria que renunciar o apego às riquezas.

A criança também caracteriza-se por não aceitar este mundo como real. De algum modo, ela acha que deve haver um outro mundo, daí as suas fantasias, que para ela são muito mais verdadeiras. Deve haver um outro lugar onde o mal sempre perde e o bem sempre vence. C. S. Lewis nas suas Crônicas de Nárnia fala de crianças que entraram por portais mágicos em um outro mundo (Nárnia), onde elas se tornaram príncipes e princesas e, quando elas cresceram foram para lá novamente através da morte, exceto uma que foi condenada a ser adulta para sempre (inferno). Foi aí que descobriram que a Nárnia da infância era apenas uma sombra da Nárnia real (céu). Nesta oportunidade veja o diálogo que aconteceu:

— Senhor — disse Tirian, após saudar a todos —, a não ser que eu tenha entendido mal as crônicas, deve haver mais alguém. Vossa Majestade não tem duas irmãs? Onde está a rainha Susana?

— Minha irmã Susana – respondeu Pedro, breve e gravemente — já não é mais amiga de Nárnia.

— É verdade — completou Eustáquio. — E cada vez que se tenta conversar com ela sobre Nárnia ou fazer qualquer coisa que se refira a Nárnia, ela diz: ‘Mas que memória extraordinária vocês têm! Continuam no mundo da fantasia, pensando nessas brincadeiras tolas que a gente fazia quando era criança!

— Essa Susana! — disse Jill. — Agora só pensa em ‘lingeries’, maquilagens e compromissos sociais.

Aliás, ela sempre foi louquinha para ser gente grande.

— Gente grande, pois sim! — disse Lady Polly. — Gostaria que ela crescesse de verdade. Quando estava na escola, passava o tempo todo desejando ter a idade que tem agora, e agora vai passar o resto da vida tentando ficar nessa idade. Tudo em que ela pensa é correr para atingir a idade mais boba da vida o mais depressa possível e depois para aí o máximo que puder. (A Última Batalha. Crônicas de Nárnia. Martins Fontes: São Paulo, 1997, pp. 160 e 161)

Que Deus nos faça como crianças para que herdemos o seu Reino!!

Rev. Glauco Barreira Magalhães Filho
Membro do Presbitério Anabatista da Igreja em Fortaleza

Prosperando através da aprovação de Deus

Escrever sobre o assunto prosperidade, no presente tempo, tem se tornado difícil. Principalmente porque, vivendo em uma época materialista, muitos cristãos estão se envolvendo com aquilo que a Bíblia diz ser contrário à vontade de Deus.

Tendo em vista o esclarecimento de algumas verdades bíblicas, quanto ao tema acima citado, iremos analisar alguns pontos procurando esclarecê-los à luz da Palavra de Deus.

Boa parte dos que professam a fé evangélica tratam seus bens como algo primordial, sem dar, lamentavelmente, seu devido valor espiritual, o que é prejudicial a nossa comunhão com Deus. Os meios que utilizaram para adquirir seus bens e o pão de cada dia foram, horrendamente, distintos daqueles que preceitua a Palavra de Deus. Formularam conceitos para justificarem suas ações e com isso denegriram os ensinamentos bíblicos. A importância dada ao trabalho honesto como uma possibilidade de ter prosperidade foi desconsiderada. Estes evangélicos preferem meios menos fatigantes para conquistarem seus ideais e, ainda ousam dizer que contam com beneplácito divino quando utilizam-se de certos artifícios perniciosos, tais como: premiações lotéricas, agiotagem, ganhos fraudulentos, etc.

A Bíblia condena acentuadamente o trabalho desonesto: Trabalhar com língua falsa para ajuntar tesouros é vaidade que conduz aqueles que buscam a morte (Pv 21:6), da mesma forma que censura o apego demasiado ao ganho financeiro: Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores. (I Tm 6:10b). Ora, alguém que foi levado por tal vento de iniquidade certamente esqueceu-se da bondade de Deus, não creu que pelos meios corretos Deus o abençoaria dando-lhe pelo menos o sustento para sua vida. Agindo desta maneira manifestou mais uma forma de desonrar ao Senhor. As Escrituras, porém, ensinam àqueles que querem viver agradando a Cristo de modo diferente: Quando, pois, tiveres comido, e fores farto, louvarás ao SENHOR teu Deus pela boa terra que te deu. Guarda-te que não te esqueças do SENHOR teu Deus, deixando de guardar os seus mandamentos, e os seus juízos, e os seus estatutos que hoje te ordeno (Dt 8:10-11).

Questionando um pouco mais sobre a prosperidade perguntamos: Seria permitido ao crente ter abundância material? Qual o objetivo em tê-la? E de que maneira adquiri-la? Antes de respondermos as perguntas, lembremo-nos que as riquezas nos expõem a várias tentações (I Tm 6:9) e o cuidado com elas é indispensável. Vejamos: durante muito tempo, principalmente na Idade Média, conceituou-se como simplicidade de vida por alguns grupos da sociedade, a abstinência plena das riquezas e dos bens materiais, contestando assim radicalmente a tese bíblica: E o SENHOR virou o cativeiro de Jó, quando orava pelos seus amigos; e o SENHOR acrescentou, em dobro, a tudo quanto Jó antes possuía (Jó 42:10). Vemos aqui que Deus fez prosperar seu servo Jó. Não contestamos a isso! Deus manifestou algum propósito naquela situação. Mas, por outro lado, muitos influenciados pelo pensamento anterior, talvez, professam indelicadamente e sem discernimento, que nenhum rico poderá entrar no Reino de Deus. Todavia, a Bíblia instrui-nos da maneira correta acerca deste assunto. Dela retemos o aprendizado que coopera com a prudência e que nos faz responder esta afirmativa da seguinte maneira: Deus concede a determinados cristãos enriquecimento, para que estes disponibilizem seu capital e invistam na seara do Mestre.

Sermos prósperos é sinal, inicialmente, de muito labor: Quem muito semeia muito ceifará. A dedicação ao ofício que dignifica o homem possibilita ou não o aumento de seus haveres. É algo também que enriquece a auto estima, e nos ajuda saber que somos capazes de servir a Deus com a mesma força na sua seara (Jz 6:11-14). Lendo o livro de Eclesiastes vemos que Salomão faz alusão similar ao nosso pensamento: Não há nada melhor para o homem do que comer e beber, e fazer que sua alma goze do bem do seu trabalho... (Ec 2:24a). O Pregador faz também menção ao fato de ser Deus aquele que derrama sua benção sobre o trabalhador: ...Também vi que isto vem da mão do Senhor. (Ec 2:24b). Isto é um dom de Deus (Ec 3:13). Aquele que muito trabalha conscientemente e aplicando bem seus recursos, calculando seus gastos, terá oportunidades de progredir. É claro que a mão do Senhor determinará o seu benefício. Cotton Mather, não apelando para o mérito humano, e com o mesmo parecer do movimento puritano, certa vez afirmou: Em nossas ocupações estendemos nossas redes; mas é Deus quem coloca tudo o que vem nelas.

Por um outro lado, o trabalho imprudente, dará sobras de cansaço e um fardo elevado. Aliás, exortando-nos sobre este aspecto Salomão ainda nos orienta quando diz: Melhor é a mão cheia com descanso do que ambas as mãos cheias com trabalho, e aflição de espírito (Ec 4:6). Sendo bem realista o escritor suscita-nos a enxergar a provisão segura ao invés da opressão do trabalho. Por isso, irmãos, deixem de lado preocupações que servem somente para cauterizarem a fé, pois elas só turbam os corações que por vezes já estão enfadados. Tal desejo imoderado nada mais é do que pura vaidade.

Se por um equívoco alguém disser que seu trabalho não lhe proporciona condições de ter abundância material, não julgue tal situação como se Deus estivesse colocando-o como cobaia para usá-lo sem propósito. Glorifique a Deus pelo pouco que Ele concedeu: Em todo trabalho há proveito... (Pv 14:23a). Quem sabe se a tua condição espiritual não te permite ter muitos benefícios materiais. Não afirmo, todavia, que para qualquer crente ser próspero tem que estar pleno espiritualmente, nem estou afirmando que todo aquele que está no cume da espiritualidade pairará sobre ele a promessa de prosperidade. Se você possuísse muitos bens será que a relapsia e a insensibilidade a Deus não falariam mais altas em tua vida? As riquezas segundo o propósito de Deus são boas, mas envolvem uma espiritualidade sem igual. Requer do homem vigilância e prudência para não ser por elas enganado.

Vejamos o exemplo de Jacó e como Deus abriu-lhe as portas com tantas bênçãos. Na casa de Labão, seu tio, Deus era com ele. Não existia um sentimento descomedido naquele homem. Ele sabia por que estava ali, fazia sua parte com afinco e dedicação. Agora, os propósitos divinos caíram sobre o patriarca. Pela providência de Deus, Jacó seu servo, prosperou e alicerçou a nação que posteriormente ficaria conhecida como Israel.

No entanto, não confundamos a benção de Jacó no Antigo Testamento, pois havia uma promessa específica voltada para a nação israelita com fins de bênçãos materiais: Antes te lembrarás do SENHOR teu Deus, que ele é o que te dá força para adquirires riqueza; para confirmar a sua aliança, que jurou a teus pais, como se vê neste dia. (Dt 8:18). Houve necessidade de prosperidade, tendo em vista a edificação do povo como nação.

Há porém, quem julgue tal promessa como sendo de direito também dos bem-aventurados do Novo Testamento. Contudo, não nos deixemos levar pelo pensamento daqueles que afirmam ser obrigatório ao crente ser próspero. Se não for, os predicantes desta doutrina sugerem a presença de problemas com pecados e envolvem as pessoas em uma situação tenaz. Com esta imposição amedrontam seus adeptos e, certamente não terão os efeitos que julgam ter. Pessoas perdem a oportunidade de estar em paz de espírito devido a ansiedade de quererem possuir bens em abundância.

Lembro-me de Paulo quando escreveu aos crentes em Filipos e deixou-nos claro o cuidado que aquela igreja tinha com ele. Por que? O apóstolo encontrava-se em duras privações materiais: Muito me regozijo no Senhor pois finalmente renovastes o vosso cuidado a meu favor... (I Tm 4:10a). O santo ministro de Deus foi um mestre, com fé inabalável foi arrebatado até o céu onde teve visões celestes, mas mesmo assim passou necessidade. A Igreja dos filipenses o acolheu sendo seu auxílio naquele momento. Mas Paulo foi ainda mais objetivo: passou frio, cansaço, fome, perseguição... Mas como um eleito de Deus pôde dizer: Posso todas as coisas naquele que me fortalece. (Fl 4:13). E o que diriam os doutrinadores da prosperidade diante da vida de Paulo? Será que Paulo estava mal espiritualmente? Ou estava encobrindo algum pecado? É algo que gostaria de ouvir dos que defendem estes princípios.

A razão da nossa vinculação da prosperidade à vontade de Deus é encontrada no Salmo 127:1-2, que diz: Se o SENHOR não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam; se o SENHOR não guardar a cidade, em vão vigia a sentinela. Inútil nos será levantar de madrugada e repousar tarde, comer o pão de dores. O Senhor é que dá aos seus amados o sono tranqüilo. A fonte é Deus. Sem ele não se produz de maneira adequada. Não tentemos, pois, realizar as coisas forçosamente, sem a iluminação do alto.

Na louca investida, muitos ainda, querendo possuir muitos proventos, acabam enveredando por outros caminhos. Um deles é apostar na sorte, ou noutras palavras, jogam com bilhetes de apostas em loterias, sorteios, etc. Existe um grande número de crentes que defendem tal idéia, porém, sinto em dizer: estão à deriva. Dizem que se ganharem algum prêmio beneficiarão a Igreja. Mas será isto bom? Relacionar ganhos típicos do mundo ímpio com a Igreja que deve ser pura e imaculada? Acredito que nossos candidatos a milionários, julgando-se futuros agraciados, mal percebem que são profundamente desinteressados pela Palavra de Deus e expõem-se a um testemunho de falta de fé. Quem é aquele que diz confiar em Deus e logo apela para meios gananciosos, mundanos e egoístas, senão aquele que não crê no Fiel Galardoador? Mas os cuidados deste mundo e os enganos das riquezas e as ambições de outras coisas, entretanto, sufocam a Palavra e ela fica infrutífera. (Mc 4:19).

Sorte no Antigo Testamento

O argumento que tenta justificar as apostas nestas jogatinas mundanas é quase sempre o mesmo. Busca-se no Antigo Testamento “motivos” para tal prática. Todavia, com argumentos que não têm ligação com o sentido em que são aplicadas. Um dos raciocínios mais utilizados é o da divisão territorial de Israel descrita em Números 26:55-56. O versículo diz: Todavia a terra se repartirá por sortes; segundo os nomes das tribos de seus pais a herdarão. Segundo sair a sorte, se repartirá a herança deles entre as tribos de muitos e as de poucos. “Ora”, dizem eles, “Se Deus separou por sortes a bênção de cada tribo, nós também poderemos receber a nossa semelhantemente”. Vamos apreciar paulatinamente o assunto até chegarmos a uma conclusão. Primeiramente, argumentaríamos o fato de haver uma situação justa. Todas as tribos seriam beneficiadas: a cada uma caberia a sua herança, segundo os que foram deles contados (Nm 26:54). Ao contrário do que acontece nos jogos de azar, quando uma ou poucas pessoas são premiadas.

Para entendermos uma segunda contra-argumentação, verifiquemos a intenção do Senhor Deus. Ele já havia determinado que as doze tribos seriam beneficiadas na divisão, ou seja, todas elas receberiam a herança pela promessa. Ora, se assim foi não seria inconsistente dizermos que a sorte serviu apenas para apontar o lugar, segundo a vontade de Deus, onde os grupos israelitas deveriam estabelecer-se. Era uma porção de terra que já havia sido demarcada pelas vitórias e conquistas dos judeus.

Uma terceira resposta seria dizer que, o texto citado acima, não se refere aos jogos e, não faz alusão a este tão encantado meio de “ganhar” dinheiro. Onde está então, o fundamento para sabermos que devemos apostar? Levemos em conta que a necessidade do sorteio foi para possibilitar ao sacerdote imparcialidade. Se ele dissesse que os da tribo de Levi, por exemplo, ficassem com as melhores porções de terra isto não nos faria imaginar que tal escolha ocasionaria muita confusão e o homem de Deus seria acusado de beneficiar determinadas tribos? A mesma coisa acontece em Levítico 16:5-10: E da congregação dos filhos de Israel tomará dois bodes para expiação do pecado e um carneiro para holocausto ...E Arão lançará sortes sobre os dois bodes; uma pelo SENHOR, e a outra pelo bode emissário. Então Arão fará chegar o bode, sobre o qual cair a sorte pelo SENHOR, e o oferecerá para expiação do pecado. Mas o bode, sobre que cair a sorte para ser bode emissário, apresentar-se-á vivo perante o SENHOR, para fazer expiação com ele, a fim de enviá-lo ao deserto como bode emissário. Para evitar queixas e reclamações, Deus ordenou que assim se fizesse para estabelecer sua vontade ou do contrário o povo reclamaria de sua oferta. Uns, certamente, diriam que prefeririam que sua oferta tivesse sido considerada de uma maneira e não da que foi sugerida pelo sacerdote. Geraria contendas e facções. Consideremos, também, algo de suma importância: o povo não tinha o Espírito Santo, permanentemente, para que escolhesse e aceitasse tal oferta por inspiração do alto. Eis aqui mais um motivo para a ação de Deus. Mas não pensemos que se Deus permitiu naquele tempo permitirá hoje esta prática. Noutra ocasião, no tempo do profeta Miquéias, nos dias de Jotão, Acaz e Ezequias, reis de Judá, o povo achou que toda e qualquer determinação de Deus seria conhecida através do lançamento de sortes. Errado! Deus reprovou e mostrou que não aceitava aquilo quando inspirou Miquéias a falar, e este lhes disse: Portanto, não terás tu na congregação do SENHOR quem lance o cordel pela sorte (Mq 2:5).

Sorte no Novo Testamento

Um outro caso que suscita questionamento é o da escolha de Matias como apóstolo. Aquele homem, que afirmo ter sido um servo exemplar (At 1:21-23), foi escolhido por sortes (Atos 1:26). Porém, procuremos discernir bem aquele fato. O que encontramos claramente na Bíblia é que Matias não foi considerado apóstolo por Deus, antes o próprio Senhor Jesus apareceu a Paulo (Saulo de Tarso) incumbindo-o do ministério. Deus não aceitou Matias como ministro por que a sorte, aos moldes do Velho Testamento, não determina mais a vontade de Deus no Novo Testamento: A sorte se lança no regaço, mas do SENHOR procede toda a determinação (Pv 16:33). Antes, o lançar sortes tem uma conotação insinuantemente maligna e mundana nesta era da graça. Quando Jesus estava na cruz, o que fizeram com sua vestimenta? E, havendo-o crucificado, repartiram as suas vestes, lançando sortes, para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta: Repartiram entre si as minhas vestes, e sobre a minha túnica lançaram sortes (Mt 27:35). Seria difícil de entender que houve um desrespeito tremendo na atitude dos guardas romanos? Colocaram algo de tão valioso, a túnica de mestre do Filho de Deus, como um objeto vulgar, tornando sem valor, fazendo o que? Lançando sorte! Isto, meu caro leitor, não é prática da Igreja pura, mas de um povo mundano. Mas, não é só na Bíblia que encontramos objeções a sorte. Até bem pouco tempo as leis brasileiras condenavam os jogos como vemos no art. 50 da Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941) e o art. 58 do Decreto-Lei nº 6.259, de 10 de fevereiro de 1944 — ambos os dispositivos apenavam os que praticavam os jogos de azar em geral e do jogo de bicho em particular.

Ora, se a sorte lançada ao acaso não for falta de fé em Deus, então, o que será? A Bíblia ensina-nos que somos reino e sacerdotes de Deus (Ap 1:8). O coração do crente está apto a ouvir a voz de Deus e dele receber instrução por graça e luz para resolução de problemas financeiros e quaisquer outros. O crente deve ter sua vida centralizada em Cristo, confiando n’Ele, nas suas promessas, reconhecendo a provisão divina: Porque todas quantas promessas há de Deus, são nele sim, e por ele o Amém, para glória de Deus por nós (II Co 1:20). Levando em consideração a instrução de Salomão, rei israelita, que diz: A riqueza de precedência vã diminuirá, mas quem a ajunta com o próprio trabalho a aumentará. (Pv 13:11). Para que, então, perder tempo esperando o improvável se podemos lançar mão no arado e comermos com o nosso próprio suor, o que é virtuoso e louvável? Ainda, se a Igreja não foi achada jogando em cassinos, fazendo apostas ou marcando bingos em nenhuma ocasião, quando da sua formação, como então achar cabível tal posicionamento hoje?

O trabalho, sabemos, é algo agradável aos olhos de Deus. O próprio Senhor Jesus disse: Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também (Jo 5:17). O nosso labor, dependendo de nossa situação espiritual, nos condicionará a termos abundância. Lembro que não é obrigação divina dar recursos em abundância por você está bem espiritualmente. Tal situação virá segundo o querer de Deus.

Sobre a Usura

Há também quem queira progredir às custas do trabalho dos outros. Não me refiro àqueles que tem empregados, antes, refiro-me àqueles que emprestam dinheiro com usura, isto é, os agiotas. Os tais especulam sobre os fundos concedidos com fins de obterem lucros exorbitantes. Não culpo somente o onzenário pela torpeza, mas também àqueles que vão até eles, confinando às vezes até a alma. A Bíblia admoesta-nos sobre esta prática, e diz: E, quando teu irmão empobrecer, e as suas forças decaírem, então sustentá-lo-ás, como estrangeiro e peregrino viverá contigo. Não tomarás dele juros, nem ganho; mas do teu Deus terás temor, para que teu irmão viva contigo. Não lhe darás teu dinheiro com usura, nem darás do teu alimento por interesse (Lv 25:35-37). Não está correto negociar com o dinheiro desta maneira. Podemos perceber qual deve ser a prática do genuíno cristão pelas palavras de Jesus: ...emprestai, sem nada esperardes, e será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo... (Lc 6:35). Devemos ajudar àqueles que de fato precisam. Não incentivo ninguém a ajudar àqueles que não querem trabalhar, ficando por aí dependendo sempre de um e de outro. Jesus apregoou a termos cuidados e socorrer os sinceros carentes. Observando melhor os fatos, vemos o quanto há de opressão neste jogo de empréstimos a juros. As pessoas ficam angustiadas por verem seus débitos dia após dia crescerem, enquanto que os usurários deleitam-se e folgam-se pela multiplicidade do seu dinheiro. Estamos de comum acordo com o Livro dos livros quando aprendemos que nossos bens ou dinheiro podem ser usados sem tamanho desamor: Não dando o seu dinheiro à usura, e não recebendo demais, desviando a sua mão da injustiça, e fazendo verdadeiro juízo entre homem e homem (Ez 18:8). Uma exortação ao povo de Deus é jamais usar deste método para viver: Se emprestares dinheiro ao meu povo, ao pobre que está contigo, não te haverás com ele como um usurário; não lhe imporeis usura (Ex 22:25). Prova o nosso temor a Deus e nosso amor para com o próximo. Quem tem isto como meio de trabalho deverá colocar em dias suas contas com Deus, pois você é mais devedor d’Ele, por conta disto, do que a soma daqueles que estão em débito contigo.

Conclusão

Àqueles que tornaram-se ricos neste mundo a custa de muito labor e dedicação, sem enveredar pela injustiça, a Bíblia tem uma exortação: Manda aos ricos deste mundo que não sejam altivos, nem ponham a esperança na incerteza das riquezas, mas em Deus, que abundantemente nos dá todas as coisas para delas gozarmos (I Tm 6:17). E, ainda: Aquele que confia nas suas riquezas cairá, mas os justos reverdecerão como a folhagem (Pv 11:28).

Deus determinará prósperos aqueles que Ele quiser. Não será uma fatalidade, e sim conseqüência de muito trabalho, e assim valorizaremos e faremos melhor uso daquilo que Deus nos concede. E sendo bem sucedido, o crente pode ter um estilo de vida simples (I Tm 6:7-10, Mt 8:20). A única coisa que mudará será a condição de disponibilizar seu patrimônio em prol do reino eterno ou ao auxílio comum, o que concorda com um pensamento que diz: O dinheiro não pode subir aos céus, mas pode realizar coisas celestiais na terra. Não necessitamos, obrigatoriamente, dar, vender ou desfazer-nos de nossos bens para podermos servir a Deus convincentemente. Servir a Deus, com os bens, consiste em entregar tudo nas mãos d’Ele, afinal de contas Ele é o dono de tudo (Êx 19:5-6, Sl 24:1 e Ag 2:8), e deles sermos apenas um mordomo bom e fiel.

Pastor Heládio Santos
Membro do Presbitério Anabatista da Igreja em Fortaleza

domingo, 10 de abril de 2011

CONFISSÃO DE SCHLEITHEIM

No ano de 1527, um grupo de líderes anabatistas se reuniu no vilarejo de Schleitheim, perto da fronteira suiço-alemã, com o objetivo de redigir resposta à violenta oposição de fora e resolver diferenças de opnião dentro do movimento Radical. Michael Sattler, que recentemente havia saído do monastério beneditino, convertendo-se à fé bíblica anabatista, foi o redator. Nesta reunião crentes testemunharam que o Espírito Santo havia guiado-os a convicções comuns.

Os sete artigos do acordo de irmãos foram:

I. Observação concernente ao batismo: O batismo será dado a todos aqueles que aprenderam o arrependimento, a regeneração de vida e que acreditam verdadeiramente que seus pecados foram expiados por Cristo, e a todos quantos andarem na ressurreição de Jesus Cristo e desejem ser sepultados com ele na sua morte, para que possam ser ressuscitados com ele, e a todos aqueles que, com esse significado, requeiram-no (batismo) de nós e o requeiram por si mesmos. Isto exclui completamente o batismo infantil, a
maior e principal abominação do Papa. Em tudo isso tem-se fundamento e testemunho dos apóstolos (Mt 28; Mc 16; At 2, 8, 16 e 19). Desejamos sustentar isso humildemente, porém firmemente e com convicção.

II. Estamos em acordo sobre a excomunhão como segue: A excomunhão será empregada em todos aqueles que deram a si mesmo ao Senhor para andar em seus mandamentos, e em todos aqueles que foram batizados no corpo de Cristo e que são chamados de irmão ou irmã, e que, no entanto, deslizam ocasionalmente e caem em erro e em pecado, sendo negligentemente alcançados. Os mesmos serão admoestados duas vezes em particular e a terceira vez abertamente e, então, disciplinados ou excomungados de acordo com o mandamento de Cristo (Mt 18). No entanto isso será feito de acordo com a direção do Espírito (Mt 5) antes do partir do pão, para que possamos partir e comer de um só pão, em unidade de pensamento e em um só amor, e possamos beber de um só cálice.

III. No partir do pão estamos em unidade de pensamento e em acordo como segue: Todos quantos desejem partir o mesmo pão em memória do corpo de Cristo sacrificado e todos quantos desejarem beber do mesmo cálice em memória do sangue de Cristo vertido na cruz, se unirão anteriormente pelo batismo no corpo único de Cristo, que é a igreja de Deus e cuja cabeça é Cristo. Como o apóstolo Paulo esclarece, nós não podemos ao mesmo tempo beber do cálice do Senhor e do cálice do diabo. Isto é, todos aqueles que andam nas obras mortas das trevas não têm parte com a luz. Portanto, todos os que seguem o diabo e o mundo não têm parte com os chamados por Deus para fora do mundo. Todos os que jazem no mal não têm parte com o bem. Portanto é e deve ser assim: Qualquer um que não foi chamado pelo único Deus, para uma só fé, para um só batismo, um só Espírito, em um só corpo com todos os filhos da Igreja de Deus não podem compor um só pão com eles, como de fato deve ser feito se alguém for legítimo para partir o pão de acordo com a ordem de Cristo.

IV. Nós concordamos sobre a separação como segue: A separação será do mal e da maldade que o diabo implantou no mundo; desta maneira simplesmente não teremos comunhão com ímpios e não andaremos com eles na multidão de suas abominações. É dessa forma: visto que todos que não andam na obediência da fé e não se uniram a Deus de forma que desejem fazer a Sua vontade são uma grande abominação diante de Deus, não é possível que nenhuma obra venha deles senão coisas abomináveis. Na verdade todas as criaturas estão divididas em duas classes: justos e ímpios, crentes e descrentes, trevas e luz, o mundo e a Igreja ("os de fora"), o templo de Deus e os ídolos, Cristo e Belial, e um não tem parte com o outro. Para nós, pois, o mandamento do Senhor é claro quando Ele nos chama para vivermos separados do mal, para que desta maneira Ele seja o nosso Deus e nós sejamos Seus filhos e filhas. Além disso Ele nos adverte que nos privemos da Babilônia e do Egito mundanos de maneira que não nos tornemos co-participantes da dor e do sofrimento que o Senhor trará sobre eles. Disso devemos aprender que tudo que não está em unidade com nosso Deus e Cristo não pode ser outra coisa senão abominação da qual devemos nos afastar e evitar. Por essas coisas se entende todos os trabalhos e serviços religiosos católicos e protestantes (Observação: aqui provavelmente o autor se refere a reuniões protestantes sob a proteção do Estado), reuniões ou trabalhos assistenciais da igreja, casas de bebida, negócios cívicos, juramentos realizados em incredulidade ou coisas do gênero que são estimados pelo mundo, e que, todavia, estão em total contradição à Palavra de Deus e em concordância com toda a injustiça que está no mundo. Por todas essas coisas nós devemos estar separados e não devemos ter parte alguma com eles, pois que eles nada são senão abominação e também a causa de nossa natureza odiosa antes de nosso Cristo Jesus., que nos libertou da escravidão da carne e nos regenerou para servimos a Deus pelo Espírito que ele nos deu. Portanto, indubitavelmente, também devem ser lançadas ao chão as armas diabólicas dos ímpios pela virtude da Palavra de Cristo. "Não resistais ao mal".

V. Nós concordamos quanto aos pastores da Igreja de Deus como segue: O pastor na igreja de Deus, como o apóstolo Paulo deixou claro, será alguém que é exemplo para todos, irrepreensível e apto a ensinar. Esse ofício será para interpretação, admoestação e ensino, para advertir, disciplinar e afastar irmãos da igreja, conduzir os crentes em oração em favor da edificação dos irmãos e irmãs, para erguer o pão quando ele for ser partido, e em todas as coisas cuidar do corpo de Cristo, de maneira que ela possa ser edificado e progredir, e para que a boca do caluniador seja calada. Além disso, essa pessoa será assistida pela igreja que o elegeu de forma que ele, que serve o Evangelho, possa viver do Evangelho como o Senhor ordenou. No entanto, se um pastor fizer algo que requer disciplina, ele não será tratado diferentemente dos demais, perante o depoimento de três testemunhas. Assim, quando eles pecarem, serão disciplinados perante todos de forma que os outros temam. Mas se acontecer de um ministro ser afastado da igreja ou ser enviado ao Senhor (pelo martírio), outro deve ser ordenado em seu lugar imediatamente para que o rebanho do Senhor não se perca.

VI. Nós concordamos quanto à espada como segue: A espada é ordenada por Deus fora da perfeição de Cristo. Ela castiga e destrói o mal e guarda e protege o bem. Na lei a espada foi ordenada para a punição e morte dos ímpios, e a mesma espada é agora ordenada para ser usada pelos magistrados terrenos. Na perfeição de Cristo, entretanto, apenas a excomunhão é utilizada para alertar e afastar aquele que caiu em pecado, sem mortificar a carne, simplesmente com a advertência e a ordem de não mais pecar. Certamente será perguntado por muitos que não reconhecem isto como a vontade de Cristo para nós, se um cristão deve utilizar a espada contra o mal para a defesa e proteção do bem, ou por causa do amor. Nossa resposta é unanimemente como segue: Cristo nos ensina e ordena a aprender dele, pois ele é manso e humilde de coração, e por isso encontraremos descanso para nossas almas. Da mesma forma, Cristo não disse para aqueles que apanharam a mulher em flagrante adultério que a apedrejassem de acordo com a lei de seu Pai (e Ele ainda diz: como me ordenou, assim eu faço), mas na misericórdia, ensinou o perdão e admoestação para que não peque mais. Tal atitude nós também devemos tomar completamente em acordo com o mandamento do afastamento do irmão. Em segundo lugar, será perguntado, concernente à espada, se o cristão proferir julgamento em disputas mundanas e discutir como incrédulos discutem uns com os outros. Essa é a nossa resposta uniforme: Cristo não desejou decidir ou fazer julgamentos entre irmãos no caso da herança, mas recusou fazê-lo. Portanto, devemos agir da mesma forma. Em terceiro lugar, será indagado a respeito da espada, se alguém deve ser magistrado e se alguém deveria ser eleito para isso. A resposta é a que se segue: Eles desejaram fazer de Cristo o Rei, no entanto Ele rejeitou e as pessoas não enxergaram isso como um plano do Pai. Assim, devemos nós fazer como Ele fez, e segui-lo, para que não andemos em trevas. Pois como Ele mesmo disse: "Aquele que quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me". Da mesma forma, Ele mesmo proíbe a uso da força da espada dizendo: "Os príncipes desse mundo dominam sobre eles, mas não será assim entre vós". Ademais, Paulo diz em sua carta: "Pois os que dantes conheceu, também os predestinou para serem conforme a imagem de Seu Filho". E Pedro também disse: "Cristo padeceu, (não dominou) deixando-vos o exemplo, para que sigais os seus passos". Finalmente, será observado que não é apropriado para um cristão trabalhar como magistrado por causa das seguintes razões: a magistratura secular é segundo a carne, a do cristão, no entanto, é segundo o espírito; a casa deles e seu reino é aqui, fica apenas nesse mundo, mas a moradia do cristão é o céu; a cidadania deles é esse mundo, mas os cristãos são cidadãos do céu.; as armas utilizadas em seus conflitos e guerras são carnais e contra a carne somente, mas as armas do crente são espirituais, contra a fortificação do diabo. Os desse mundo ímpio se armam com aço e ferro, mas os cristão são armados com a armadura de Deus, com a verdade, com a justiça, paz, fé, salvação e a Palavra de Deus. Em resumo, como é na mente de Deus a respeito de nós, também deve ser a mente dos membros do corpo de Cristo voltada para Ele em todas as coisas, para que não haja cisma no corpo que o leve à destruição. Agora, já que Cristo é como as Escrituras o descrevem, os membros de seu corpo devem também estar em acordo, de forma que o corpo permaneça completo e unido para que possa progredir e ser edificado.

VII. Estamos em acordo a cerca do juramento com se segue: O juramento é uma confirmação entre aqueles que estão em discórdia ou fazendo promessas. Na Lei é ordenado realizá-lo em nome de Deus, mas apenas em verdade, não falsamente. Cristo, que ensinou a perfeição da Lei, proibiu qualquer tipo de juramento entre seus seguidores, quer seja verdadeiro ou falso - nem pelo céu nem pela terra, nem por Jerusalém nem pela sua cabeça - e pelo motivo que ele posteriormente dá, ninguém pode tornar um cabelo branco ou preto. Então nota-se que, por esta razão, todo juramento é proibido: não podemos assegurar que iremos realizar o que prometemos quando fazemos um juramento, visto que não podemos sequer mudar nada em nós mesmos. Agora há alguns, que não dão crédito a um simples mandamento de Deus, que objetam com essa pergunta: o próprio Deus não jurou à Abraão quando o prometeu que Ele estaria com Abraão e que seria o seu Deus se ele continuasse em Seus mandamentos? Por quê então não devo também jurar quando faço uma promessa a alguém? Resposta: Ouça o que dizem as Escrituras: Deus, visto que Ele desejava mais abundantemente mostrar a seus herdeiros a imutabilidade de sua deliberação, proferiu um juramento para que tivéssemos uma poderosa consolação, pois é impossível a Deus mentir. Observe o sentido das Escrituras: O que Deus proíbe de fazer, Ele próprio tem o poder de fazer, pois nada é impossível para Ele. Deus fez um juramento a Abraão, dizem as Escrituras, para que Ele pudesse mostrar que sua deliberação é imutável. Assim o é pois ninguém pode frustar nem opor-se à vontade de Deus. Portanto, Ele pode manter firme seu juramento. Nós, por outro lado, não podemos fazer nada, como nos ensinou Jesus, não podemos manter ou garantir nossos juramentos. Portanto, não devemos de maneira alguma jurar. Outros vão mais longe e refutam, dizendo: não é proibido por Deus jurar no Novo Testamento, embora seja, na verdade, um mandamento no Velho Testamento, mas é proibido apenas jurar pelo céu, pela terra, por Jerusalém ou pela sua cabeça. Resposta: ouça as Escrituras: quem jura pelo céu jura pelo trono de Deus e por Ele que está assentado sobre o trono. Note: é proibido jurar pelo céu, que é apenas o trono de Deus; quanto mais ainda é proibido jurar por Deus! Ignorantes e cegos, qual o maior: o trono ou aquele que está assentado? Outros ainda dizem: por que o mal está agora no fundo e por que o homem precisa de Deus para a fixação da verdade, os apóstolos Paulo e Pedro também juraram. Resposta: os apóstolos Pedro e Paulo apenas testificaram do que Deus havia prometido a Abraão em Seu juramento. Eles mesmos não prometeram nada, como o exemplo deixa bem claro. Testificar do juramento e fazer o juramento são coisas diferentes. Pois quando uma pessoa jura, ela está em primeiro lugar prometendo coisas futuras, como Cristo foi prometido a Abraão e, muito tempo depois, foi por nós recebido. No entanto, quando uma pessoa dá testemunho, ela testemunha do presente, quer seja bem ou mal, como Simeão falou a Maria sobre Cristo e testificou: "Esta criança é posta para a queda e elevação de muitos em Israel, para ser alvo de contradição, e para que se manifestem os pensamentos de muitos corações." Cristo também nos ensinou da mesma forma quando disse: "Seja sua palavra sim, sim e não, não. O que disto passar vem do maligno." Ele disse que nossa palavra deve ser sim ou não. Todavia quando alguém não deseja entender, não chega ao significado. Cristo falou de maneira bem simples: sim ou não, e todos quantos buscam ao Senhor irão entender de maneira simples a Sua Palavra. Amém.

Os Sete Artigos de Schleitheim
Cantão de Schaffheusen, Suíca
24 de Fevereiro de 1527

JESUS CRISTO, O FUNDAMENTO

Francisco Carlos Pereira da Silva

O catolicismo romano tem como doutrina a crença de que a igreja está fundamentada em um homem, o qual seria o seu sumo pontífice ou papa. No entanto, esta não é uma doutrina bíblica, e muito menos verdadeira. As Escrituras relatam que Cristo é o único e exclusivo soberano da igreja. Ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo (I Cor 3:11).

Em I Pedro 2:4, o referido apóstolo chama Cristo de pedra viva: chegando-vos para Ele, pedra viva, rejeitada, na verdade, pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa. Isaías e Paulo também chamam Jesus de pedra de esquina (Is 28:16 e Ef 2:20). O vigário legítimo de Cristo é o Espírito Santo, sendo função sua lembrar aos discípulos tudo que Jesus ensinou e guiá-los através das Escrituras à toda verdade.

O que seria da igreja de Cristo se esta tivesse por vigário um homem? Certamente seria uma religião dominada por um pontífice humano, frágil e limitado como qualquer um de nós. Mas graças a Deus temos o Santo Espírito como guia, e não seguimos o papa ou qualquer outro homem, mas seguimos a Deus, que sempre é verdadeiro.

Cristo falou que daria as chaves do céu a Pedro (Mt 16:19), significando que daria a autoridade de pregar o evangelho. A mesma autoridade foi dada à sua igreja (Mt 18:18). O povo de Deus tem as chaves do reino dos céus, e Cristo não faz acepção de pessoas. Você, católico romano, pode aceitar a Jesus Cristo como seu único e suficiente salvador e Senhor, e assim exercer também esta autoridade. Desta forma você fará parte da igreja verdadeira, a igreja que prega o que está contido na Bíblia Sagrada, sem nada tirar ou acrescentar. Qualquer outra igreja que pregue outro caminho para se chegar a Deus nega as Escrituras e nela não está a verdade.

A Vida Abundante de B. H. Carroll

B. H. Carroll, o gigante entre os maiores cristãos, deste século, faleceu em 1914, depois de pastorear por mais de 30 anos a Primeira Igreja Batista de Waco, Texas. Mantinha correspondência com os estudantes de Baylor University. Foi o fundador do Southwestern Baptist Theological Seminary e autor de mais de trinta livros, incluindo comentários sobre a Bíblia.

A Conversão nas suas Próprias Palavras

«Quando contava vinte e dois anos, jurei que nunca mais voltaria a uma igreja. Meu pai falecera na crença que eu estava perdido. Minha mãe (quando é que a mãe abandona o filho?) veio a mim certo dia e pediu-me, pelo amor que eu lhe devotava, para assistir a mais uma reunião. Houve uma série de conferências, no outono de 1865. Não senti, porém, o menor interesse por elas. Gostei dos hinos, mas a pregação não me impressionou de modo algum.

Mas um dia – nunca posso esquecê-lo, – foi num domingo às onze horas. O modesto tabernáculo estava superlotado. Eu me encostara às minhas muletas, suportando indiferentemente a pregação, do lado de fora. O pregador fracassou. Não havia para mim qualquer mensagem no sermão. Quando ele desceu do púlpito, esperei que nos exortasse como sempre o fazia. Mas quão grande foi minha surpresa quando ele iniciou uma série de perguntas que pareciam dirigidas somente a mim. "E vós, que estais rejeitando o Evangelho, escarnecendo de nós povo humilde, que tendes? Respondei honestamente diante de Deus. Tendes encontrado alguma coisa de valor onde estais?"

Meu coração disse, imediatamente: "Nada debaixo do céu, absolutamente nada".

O pregador continuou: "Há algum outro valor na vossa esfera de atividade que valha a pena experimentar?"

Outra vez meu coração afirmou: "Nada, absolutamente nada. Já experimentei todas as estradas do mundo e elas só conduzem ao abismo e à perdição".

"Então, continuou ele, admitindo-se que não haja valor naquilo que estais seguindo, se há um Deus, não deve haver alguma coisa de valor em alguma parte? E, se houver, porventura não estará ela aqui? Estais dispostos a experimentar para crer? Tendes a honestidade e a coragem necessárias para a prova? Não estou pedindo que leiais qualquer livro, nem busqueis testemunhos ou façais sacrifícios em exaustivas romarias. Este caminho é longo demais e o tempo urgente. Estais dispostos a tomar uma iniciativa, começando uma prova prática e experimental, sendo vós mesmos os juízes do resultado?".

Essas perguntas sensatas e convincentes tocaram-me profundamente, mas não entendi o teste.

O pregador continuou: "Meu teste é baseado em dois trechos das Escrituras: João 7:17 e Oséias 6:3. Pela primeira vez os entendi. Nunca ouvira antes a exposição do primeiro tão exata como ele a deu. Explicando o trecho Se alguém QUISER FAZER a vontade dele, demonstrou que o conhecimento da vontade de Deus depende de nossa disposição interior ou do desejo íntimo de obedecê-la e realizá-la. Deus está pronto a revelar Sua vontade àqueles que desejam executá-la.

Do outro trecho também recebi nova luz: "Conheçamos, e prossigamos em conhecer ao Senhor". Isto significa que, o conhecimento verdadeiro é obtido pela persistência em buscá-lo, e não pelas investigações temporárias e inconstantes.

Quando o pregador convidou os que quisessem submeter-se a um teste experimental para chegar à frente e, apertar-lhe a mão, fui imediatamente. Não esperei pela emoção que o convite despertaria na congregação. Minha incredulidade e atitude hostil eram conhecidas na vizinhança, de modo que a minha ida à frente causou grande sensação. Alguns chegaram até a gritar de alegria! Com o intuito de evitar qualquer equívoco, eu me levantei e disse que não estava convertido; que talvez eles estivessem interpretando erroneamente minha decisão de atender ao apelo do pregador; que o meu coração permanecia tão frio como gelo. Expliquei que, aceitando a sugestão do pregador, estava disposto a fazer um teste sobre a verdade e o poder da religião cristã. Confessei que estava pronto a perseverar na experiência até que uma solução verdadeira fosse encontrada. Estas palavras acalmaram a todos.

As conferências encerraram-se sem qualquer mudança em mim. O último sermão terminara e a despedida fora feita. A congregação ia-se dispersando. Algumas senhoras permaneceram perto do púlpito, cantando. Senti que meu teste já havia sido feito sem que qualquer solução para meu problema fosse encontrada. Fiquei, atraído pela música, e ouvi:

"Ó terra de descanso entre as estrelas no ar,
Na saudade de ti, neste anseio que vivo,
Quando o instante feliz em que irei descansar?"
Vem a Mim

"Este hino impressionou-me profundamente. A música era tão suave como o roçar de asas de anjos. De súbito, vieram-me à mente, como luz do céu, estas palavras de Jesus: "Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei". Não via Jesus com os meus olhos, mas tinha a impressão de que O contemplava diante de mim, olhando-me com terna repreensão. Parecia repreender-me por ter ido a todas as outras fontes em busca do descanso, menos à verdadeira fonte. Agora Ele estava apelando e convidando-me para ir a Ele. Repentinamente, de uma vez para sempre, lançei-me aos Seus pés, sem reservas. E naquele instante encontrei o descanso que perdura até hoje.

Não falei publicamente sobre a mudança que se operou em mim, mas passei uma noite gozando-a e imaginando se ela ainda estava comigo até a madrugada. Raiou a aurora e ela ainda estava, mais brilhante que os raios do sol e mais doce que o cantar dos pássaros. Então, pela primeira vez, entendi a palavra das Escrituras, que muitas vezes ouvira mamãe repetir.»

O Revestimento do Espírito

O Dr. Carroll, falando acerca da plenitude do Espírito no viver e no servir, relata, no livro "The River of Life", p. 160, o seguinte fato:

"Três homens tinham concordado em estudar o Novo Testamento e todos os ensinamentos nele contidos a respeito do Espírito Santo. Depois do meticuloso estudo, todos os três chegaram à conclusão de que, quando o crente recebe o dom do Espírito Santo, esse fato importa numa transação definida; que nessa transação aquele que recebe tem certas obrigações a cumprir; que essa transação é tão definida como a fé em Cristo. Que o crente tem que crer no Espírito da forma como creu em Cristo; e que, pela fé, ele deve receber o Espírito como recebeu Cristo.

Depois dessa ilação, um dos três disse: – Estou certo de que ainda não recebi a plenitude do Espírito.

- Por que dizes isso? Inquiriu-lhe o outro.

- Porque não recebo as Suas manifestações. Confio em Jesus Cristo como meu Salvador, estou convertido, mas vida cristã deixa muito a desejar. Não tenho alegria bastante no meu coração. Desejo sentí-la de maneira mais intensa. E, além de tudo isso, não tenho, absolutamente, nenhum poder.

- És sincero nesse anseio do coração por esse dom que te encherá de alegria e poder em relação a Deus e aos homens? perguntou-lhe o outro.

- Sim.

- É somente alegria o que está buscando?

- Não, não é isso; parece-me que o meu testemunho de crente tem pouco valor. Não exerço nenhuma influência sobre as outras pessoas. Não tenho podido orar como desejaria fazê-lo. Quando estou orando, não tenho aquela sensação de estar em contato com Deus.

- Gostarias de gozar essa comunhão? perguntou-lhe o outro.

- Por certo.

- Estarás disposto a fazer exatamente o que a Bíblia manda para alcançar essa vitória?

- Estou.

- Começarás agora mesmo?

- Pois não.

Conheci bem esse caso. Posso acrescentar ainda que eu era uma dessas três pessoas. Se quisesse, poderia citar o nome das outras, mas não o farei.

Aquele homem lutou durante três semanas, desesperadamente, purificando-se para ser digno de receber o Espítito; levando a sua fé até o ponto de aceitar a promessa e jamais abandoná-la. Gastou três semanas nessa labuta, mas a questão de tempo pouca diferença faz. Não precisaria ter demorado tanto, do mesmo modo que um homem não precisa de um mês para aceitar Cristo; mas algumas pessoas alcançam essa experiência desse modo, e a ele custou três semanas estar pronto. Entretanto, uma coisa é certa: ele recebeu o dom do Espírito, o qual lhe trouxe alegria consciente e eterna, dando-lhe um poder que não trocaria por toda riqueza do mundo".

Na explicação que o Dr. Carroll dá sobre esta vitória, no seu livro encontramos:

"Todo crente é completo em Cristo, isto é, quando recebemos Cristo, somos herdeiros de toda a herança que Cristo tem para nós. Mas somente pelo Espírito é que podemos nos apoderar de qualquer parte desta herança. Tomamos posse desta herança, bênção por bênção, à medida que temos capacidade para isto. Todas as bênçãos são garantidas a nós por meio de promessas. Pela fé temos de lançar mão e nos apropriar de cada uma delas.

1. Todas as dádivas, graças e bênçãos da salvação são dadas a todos os crentes por meio de Cristo.

2. Aceitando Cristo, temos direto a todas elas.

3. Todas estas bênçãos são asseguradas pelas promessas de Deus.

4. Nenhuma delas é conseguida por nós sem que o Espírito Santo no-las aplique.

5. Esta aplicação não é feita de uma só vez e nunca devemos presumir que a possuímos sem que nos apropriemos dela.

6. O crente é levado pelo Espírito a pedir em oração, reclamar, esperar e lançar mão de cada bênção, uma por uma.

Sim, eu afirmo que o crente tem de reclamar seu direito e pedir a realização da promessa. Ele tem de pedir e esperar; e, por um ato especial de fé, lançar mão e se apropriar dela. Desta maneira Deus a cumpre.

Há certas promessas divinas que os crentes desta igreja e muitos outros têm o direito de gozar por terem aceito Cristo, mas jamais as gozaram e estão falhando em possuir essas bênçãos, e isto lhes rouba a alegria e o poder cristão. A falta de alegria e poder cristão não só desonram Cristo, diminuindo Sua riqueza e graça, mas rouba a luz e a influência dos crentes.

O que estamos considerando agora é uma bênção para o cristão – o homem convertido, não para fazê-lo um filho de Deus – mas porque ele já é filho de Deus, como no caso idêntico de adoção do Espírito. "E porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de Seu filho, que clama: Abba, Pai".

Disse ainda o Dr. Carroll, em seu livro sobre o Espírito Santo: "Minha pregação de hoje forçosamente seria vã sem o Seu selo; não ousaria esperar êxito com palavras persuasivas de sabedoria humana. Quero dizer que o culto de hoje seria bronze que soa e címbalo que tine, se não realizado com demonstrações do Espírito e do poder. Ele é o Vigário de Jesus Cristo, e, portanto, Seu mais leve murmúrio de aprovação, ou seu mais breve olhar de encorajamento devem significar, e de fato significam (Deus julgue da verdade das minhas palavras), mais que os aplausos de todo o universo ou todos os elogios que jamais partiram de lábios humanos."

Do livro Labaredas de Fogo, de 1962, de Rosalee Appleby.