quarta-feira, 5 de agosto de 2020

O Peso de Glória da Admoestação


Você já parou para refletir sobre a forma como Jesus admoestava os pecadores? Sim, Ele os admoestou! De forma especial e inspirativa procurava despertá-los para o arrependimento através da proclamação da primordial mensagem, a do Reino de Deus. Era a busca pelas ovelhas perdidas de Israel, primeiramente; revelou-se, em tempo posterior, na elucidação de sua vontade divina, ser também apropriada para os “cachorrinhos” que comiam das migalhas caídas da mesa dos filhos (Marcos 7:28), ambas desgarradas por causa das vicissitudes da vida. Estabelecendo um princípio, Nosso Senhor, cheio de compaixão e misericórdia, falava com uma fluência estimulante e deixava perceber a grandiosa virtude da preocupação individual sem qualquer outro propósito, senão o de restituir vidas para Deus pela venerável arte da admoestação. Assim, discorrerei sobre o assunto procurando chamar a atenção do leitor para a forma adequada de usá-la para a glória de Deus e nunca para a vanglória humana.

         A mensagem de Cristo era contagiante porque livrava o pecador da morte e o reconduzia para uma Nova Vida, caso houvesse arrependimento. Quem não se lembra da pecadora “aprisionada” por uma turba de homens que a pegaram em ato de adultério? De Zaqueu, o embusteiro, enriquecido pelo surrupio de bens alheios? De Paulo, o perseguidor da Igreja? Todos são claros exemplos da transformação operada pela graça e suas histórias ecoam para que outros despertem, assumam sua condição e aceitem a repreensão benevolente do Amado Salvador em arrependimento. Seus frutos? Dos dois primeiros há poucas informações, mas de Paulo encontramos uma prova concreta de que ao aceitar o beneplácito divino permitiu da mesma forma ser portador daquela mensagem prodigiosa, admoestando seus ouvintes e em seguida à Igreja por semelhante caminho: “Portanto, vigiai, lembrando-vos de que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós” (Atos 20:31).

         Lembro, segundo os exemplos acima, que a admoestação deverá ser sempre uma repreensão benevolente em qualquer situação que a motive. Reconheço que em alguns momentos não seja algo muito fácil até porque podem alguns ser tomados mais pelo calor das circunstâncias do que pela virtude propriamente cristã. Mas é exatamente por não se achar apto para a repreensão que se faz necessário um retorno, talvez até cotidianamente, àqueles princípios contidos nos Evangelhos para aprumar a conduta pelo grandioso fundamento. Sobre esses princípios, posso lembrar as Bem-Aventuranças do sermão do monte. Indubitavelmente, um manancial de vida e de espiritualidade, conferindo conhecimento autêntico de como é o comportamento cristão e o referencial para sempre praticá-lo. Todos aqueles que se aprofundam nesses temas têm a possibilidade de alcançar o gracioso testemunho que evidencia o ápice da carreira cristã (oh, como anelo!). Com eles e com tantos outros ensinos sobre as virtudes cristãs, a Igreja pode ser conduzida a olhar o outro (o membro do corpo de Cristo, o cristão congregado) com muito mais piedade e compaixão. Afinal, ele é o destino da admoestação e também faz parte da Noiva de Cristo.

         Admoestar é repreender para correção, é denunciar o pecado encarecendo o bem a fazer e é a prova incontestável do apreço e cuidado pela vida de um cristão surpreendido por algum delito. Paulo nos conduz a agir em admoestação com muita sabedoria e cuidado nos seguintes termos: “Não repreendas asperamente o ancião, mas admoesta-o como a pai; aos moços como a irmãos; as mulheres idosas, como a mães, às moças, como a irmãs, em toda a pureza” (I Timóteo 5:1-2). Até mesmo para os rebeldes e insurgentes existe uma maneira de tratamento no arcabouço apostólico que visa sua reparação espiritual: “Mas, se alguém não obedecer à nossa palavra por esta carta, notai o tal, e não vos mistureis com ele, para que se envergonhe. Todavia não o tenhais como inimigo, mas admoestai-o como irmão” (II Tessalonicenses 3:14-15).

Daí repousa sobre os possuidores deste excelente dom grande responsabilidade, porquanto não serão emissários de uma repreensão descompromissada, mas se prestarão à arte e ao dever de admoestar para edificar. É procurando estimular a busca por este conhecimento que asseguro a necessidade de a Igreja de Tessalônica ser mais conhecida através das epístolas paulinas, e não ser examinada superficialmente ou como se diz por estes lados da Terra Brasilis, com ligeireza. Ora, Paulo atesta que essa Igreja tinha uma prática louvável de velar pelos seus membros: admoestação para edificação. Entendo que existia reciprocidade na situação, não havendo interesses espúrios entre o admoestador e o admoestado criando, assim, o ambiente perfeito para o exercício e prática da virtude apresentada. Refiro-me, nestes termos, porque vem de Paulo a informação que não me permite pensar nada além disso: “Sempre damos graças a Deus por vós todos, fazendo menção de vós em nossas orações, lembrando-nos sem cessar da obra da vossa fé, do trabalho do amor, e da paciência da esperança em nosso Senhor Jesus Cristo, diante de nosso Deus e Pai” (I Ts 1:2-3). Era uma Igreja fiel não somente na doutrina, mas na sua prática; não apenas pregava, mas vivia o que pregava; correspondendo ao supremo interesse de juntar seus congregados e acolhê-los sempre para edificá-los (tomando emprestado o anseio de Cristo ao relatar seu desejo de juntar e unir os filhos de Israel em Lucas 13:34).     

Conhecer um crente espiritual é muito fácil e ao mesmo tempo muito difícil. Entenda-me, a singularidade como pratica suas obras e se relaciona com o próximo já seria mais do que suficiente, contudo, talvez em decorrência da fertilidade julgadora nada edificante de algumas mentes injuriosas, torna-se complicado provar para esses carrancudos os santos afetos. Além disso, não confunda o interesse do postulado apostólico com as formas de direitos de hoje. Por força de ideologias e elementos de reivindicações de direitos seculares muitos não gostam de ouvirem admoestações, muito embora precisem. Para eles, isso soa como julgamento temerário. Não é! Estão tão cheios do espírito reivindicante secular que se esqueceram da simplicidade que o cristão deve ter à semelhança do Cordeiro de Deus, inocente, que caminhou mudo perante seus tosquiadores. O admoestado deve entender que a indicação de pecado na fala do seu admoestador, pautada na Escritura, representa o melhor para a sua carreira cristã, pois a orientação não vem do homem antes vem de Cristo. Doravante, não se deve entender essa relação como uma disputa na qual vence aquele que apresentar o melhor argumento quando alguns, inclusive, injetam sofismas e predicações desconexas com os fatos.

Com ideal completamente contrário ao supracitado, Jesus ensinou a predisposição para conservação da comunhão entre os irmãos através dos seguintes termos: “se teu irmão pecar contra ti, vai, e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão” (Mateus 18:15). Vejo no texto como motivação do fato a prática de pecado contra alguém, a forma de ação é ir até quem pecou e a maneira de resolver por um diálogo amigável e compassivo. Emerge, então, uma dupla possibilidade como consequência: aceitar ou não aceitar a repreensão. A aceitação encerra o problema (glória a Deus!), mas a não aceitação gera maiores problemas, quais? A rebeldia imperante do admoestado ou a possibilidade de pensar sobre a falta de perícia (sabedoria) do admoestador. Por que o admoestador não foi exitoso em sua ação? Talvez pela falta de destreza em demonstrar piedade, compaixão e amor pelo admoestado; talvez, por inexperiência; talvez, por expressar de forma explícita desinteresse no “resgate” do amoestado; enfim, dentre outras possibilidades. Contudo, em Lucas 17:3, em igual narrativa sobre esse doutrinamento, exige-se cautela e atenção para ambos os lados da questão: “Olhai por vós mesmos” a fim de que a prudência e a compaixão permaneçam na resolução do conflito. Noutras palavras, tanto um como o outro devem sujeição ao Santo Espírito para que através dele possam ser conduzidos pelo caminho em busca da paz entre ambos.

Aos que gozam do sublime talento de admoestar, procurem utilizá-lo com capricho e reverência porque é destinado à Noiva de Cristo em sua particularidade. Não ostentem vanglória ou vil sentimento de merecimento já que não somos dignos de tê-lo. Não usem para maltratar o irmão ou a irmã muito embora a prática que motivou a censura possa ter sido repugnante, antes seja prudente e sério diante do pecado; jamais coloque sobre si a mancha do desprezo pelo outro (Mateus 18:10). A regra paulina, se é que posso chamar assim, está explicitada em Gálatas 6:1 e diz: “Irmãos, se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão; olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado”. Neste caso, pode não haver uma segunda pessoa envolvida no pecado como acima descrito, simplesmente, esse(a) cristão(ã) incorreu numa prática pecaminosa afetando somente a si. Outro cristão não envolvido, mas ciente do teor da ocorrência pode ter visto ou ter ouvido ou, ainda, ter recebido a confissão. Em mente, deve entender e praticar as ações explícitas e implícitas no texto, quais sejam: julgar, inicialmente, com afetação de dor e pesar (Romanos 12:15) pelo fato de algum cristão ter sido surpreendido em alguma ofensa que quer dizer que não era o hábito ou o normal de se ocorrer [não posso como cristão ficar feliz ou ter qualquer outro sentimento quando um(a) irmão(ã) em Cristo sofre o prejuízo da queda]; procurar encaminhar o tal com a sensatez da mansidão, haja vista ações sem equilíbrio emocional e sem o domínio de espírito, por mais inquietante que seja a ocorrência, poderá enviesar para outros rumos distintos dos quais pretendia o Espírito de Deus ao se pronunciar por instrumentalidade de Paulo; ser vigilante e solidário para não ser tentado por igual artificio do inimigo (geralmente digo que devemos nos colocar na mesma situação para que nessa internalização do fato encontremos a forma mais adequada de auxiliar em conformidade ao que Jesus nos ensinou: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a Lei e os Profetas” [Mateus 7:12]). A meu ver, esses são alguns pré-requisitos essenciais para os que admoestam, ora chamados de “espirituais” por Paulo.

Como cristão, não posso me omitir da prática da admoestação, sobretudo, porque deverá expressar o cuidado de Cristo a um “soldado caído”. A Igreja assumiu essa função na sua individualidade e na sua coletividade com expectativa do mesmo fim: a reparação e a edificação. Portanto, jamais poderá se omitir, jamais deverá rejeitar, jamais deverá recusar-se a praticá-la visto que está em causa a saúde espiritual do seu próprio corpo, pois um só membro, por mínimo que pareça, é necessário. Que o Espírito de Deus continue nos encaminhando para praticar todo o bem necessário sem reservas, como disse Pedro: “aparte-se do mal, e faça o bem; busque a paz, e siga-a” (I Pedro 3:11).

 

Pr. Heládio Santos

 

 


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