Você
nunca fará nada neste mundo sem coragem.
É
a melhor qualidade da mente ao lado da honra.
Aristóteles
O sonho era antigo. Talvez remonte a
juventude quando por influência da irmã Helena (formada em Letras e professora
de línguas antigas na Assembleia de Deus) foi instigada a prestar vestibular para
ingressar na faculdade e ter uma profissão. Algo um tanto quanto inusitado na
época para muitos evangélicos cujas igrejas não consideravam o estudo acadêmico
importante. Era o final da década de 80, instante no qual essas mesmas Igrejas
ainda usufruíam de espiritualidade intensa e devotada para o fiel cumprimento
da vocação inspirada pelo bom Salvador. Por isso, o sonho não se realizou
naquele momento, na verdade, foi substituído por um “chamado” de Deus para
ajudar o pai (José Silva Tôrres) numa ousada investida: abrir um trabalho
missionário em lugar avesso à pregação do puro Evangelho, rebelde e tantas
vezes perseguidor.
Passaram-se anos e
através de sua ajuda incansável o trabalho prosperou, ganhando aquela obra considerada
referência na região; passando a ser, então, uma Igreja e não mais um ponto de
pregação, apesar da existência de um templo desde o começo. Durante aqueles
anos, também serviu nos negócios da família, tendo dores de cabeça e alegrias
como frutos do labor secular, mas sempre prestando o melhor trabalho possível.
Foi de fato um grande apoio para o pai. Uma década passou laborando na região
de Beberibe, aproveitando também as belezas naturais das ensolaradas praias ali
existentes, ainda puras e não tocadas pela exploração turística e imobiliária.
Um bálsamo para quem lutava desde o raiar do dia (literalmente falando) até à
noite, no apagar da luz do quarto quando era vencida pelo cansaço já na
madrugada.
Este tempo só cessou
quando retornou para a capital devido seu enlace matrimonial. A labuta passou a
ser a da sua própria casa, mas como sempre se mostrou uma pessoa com muita resiliência
queria algo mais. Retornou ao SENAC para aprender a trabalhar com o pacote
OFFICE da Microsoft. Recebeu seu certificado após a conclusão de seu curso.
Vieram as filhas para as quais dedicou cada momento, aproveitando o vínculo e
exercendo o papel de mãe com esmero. Em nenhum momento pestanejou ou relutou
pelas dádivas que o Senhor Deus havia lhe confiado. Quando as meninas
cresceram, tornando-se um pouco mais independentes, resolveu buscar cursos de
formação de nível médio para, quem sabe, cursar uma graduação. Foi em busca do
CEJA (Centro de Educação de Jovens e Adultos) em Messejana, local no qual
recebeu grandes estímulos para realizar seu antigo sonho. Nesse ínterim,
sentiu-se na responsabilidade de fazer um curso de secretariado (CETREDE) para
que no final pudesse buscar um emprego e ajudar em casa, uma vez que naquele
momento seu marido não gozava de vínculo empregatício. Foi resoluta em seu curso. Aproveitou oportunidades
como secretária na PRF (Polícia Rodoviária Federal) tirando a folga de uma
amiga de curso para ganhar algum dinheiro e assim poder ajudar nas despesas do
lar. Mas, não esquecia de seu sonho. Prestou vestibular na UECE. Não foi
aprovada. Fez suas primeiras tentativas no ENEM, mas sem uma boa preparação também
não logrou êxito. Conciliou a ida para deixar as filhas na escola, na época no
Centro, para fazer um cursinho de preparação para o ENEM. Conseguiu um curso
acessível para as condições financeiras da família: APESC (Associação dos Professores
do Ensino Superior do Ceará). Recebeu muito apoio dos professores. Cumpriu
novamente seu papel de estudante 30 (trinta) anos após concluir o ensino médio.
Dedicou-se. Estudou. Fez inúmeras redações, ora com notas não tão boas, ora com
algumas que motivaram esperanças. Desejou caminhar pelo meio ambiente, tendo a
primeira aprovação no IFCE, no curso de Técnico em Meio Ambiente, mas algo mais
forte lhe chamava para outro caminho. Enfrentou novamente a fera do ENEM com
bravura a fim de derrubar aquele bicho papão que já lhe tinha derrubado em
momentos passados, mas não a tinha desanimado... Enfim, a fera não resistiu sua
força interior e entregou o prêmio pela sua determinação: a aprovação no curso
de Pedagogia da Universidade Federal do Ceará, um dos cursos cujas notas de
corte têm sido muito altas desde que o ENEM foi adotado como forma de ingresso.
Hoje, Maria Luísa
(carinhosamente conhecida como Maninha) conclui sua graduação, defendendo seu
aprendizado ao longo dos anos na academia. Seu olhar voltou-se para aqueles que
como ela tiveram muita dificuldade para ingressar na Universidade. Estudou,
para realizar sua monografia e concluir seu curso, “o ensino cooperativo entre
surdos”, entendendo seus anseios, suas paixões, seus desafios e suas
esperanças. Identificou-se com eles. Adora se comunicar conosco através de
sinais. Não gosto porque nada entendo (preciso fazer mais algum curso de
libras), mas percebo sua sensibilidade e seu envolvimento com seu objeto de
estudo. Nada mais louvável.
A fé, portanto, tem o
poder de transportar montes como bem disse Jesus e cumprir nosso papel enquanto
cristãos, pois somos instigados a buscar conhecimentos salutares para o
desenvolvimento humano para também podermos exercer nossa influência ética, moral,
disciplinada e compromissada com valores que exaltam o ser humano enquanto
piedosos em Cristo. Como membro da Igreja Batista Renovada Moriá, Maninha passa
a ser referência e estimula os congregados que desejam chegar mais longe a
sonharem. Aos 50 (cinquenta) anos, começa uma nova fase de
sua vida. Agora, com a certeza do dever cumprido e com uma profissão em mãos,
alcançada pela pura determinação de um nobre coração; daqui há alguns dias,
após o reitor lhe conferir o título, será graduada.
Ao longo de sua
caminhada na Universidade fez muitas amizades, certamente pelo jeito simples e
cativante de ser. Criou vínculos. Amparou muitas colegas de turma. Aconselhou.
Soube caminhar por cada situação confirmando e nunca deixando de ser esta
pequena grande mulher cristã.
Agradecimentos à prof(a). Dra. e Diretora
(Faculdade de Educação) Maria Isabel Filgueiras Lima Ciasca, ao Prof. Doutorando Hermany Vieira, à Prof(a) e Doutoranda Nágila
Rabelo e à Pedagoga Amanda Rodrigues pelo apoio na construção do conhecimento e
desenvolvimento da monografia.
Essa matéria é uma singela homenagem de
seu marido e de suas filhas (Heládio, Hévila e Lívia)
Glórias, honras e louvor sejam sempre ao
nosso grande e amoroso Deus cujo Filho, Jesus, através do Santo Espírito, nos
faz triunfar!