“O anabatismo primitivo era um
movimento religioso e de revolução social” (Wohlfeil, Goertz 1980, p. 43) que
não se opunha a fazer uso da espada em favor de sua causa (Stayer 1972).
Contudo após os Artigos de Schleitheim (1527), eles recusaram-se a portar armas”.
(Lindberg,
p. 243)
Uma das premissas mais corriqueiras na Academia é aquela que
enfatiza o conhecimento como provisório. Chegou-se a essa conclusão, não
simplesmente por achismos ou conclusões insustentáveis, mas sim, pelo amparo e
fundamento em fatos concretos que conseguem desafazer uma argumentação teórica
inicial. Baseados nesse pensamento, propomos uma análise da informação acima
sobre o anabatismo, já que o trata como uma vertente similar ao catolicismo e
ao protestantismo da época, cuja ação militarizada era pauta constante naqueles
tempos pré-nacionalistas. Então, será que na gênese anabatista verificou-se a
conduta de luta armada e revolucionária?
Para responder esse questionamento, importa trazermos à tona
a concepção cristã do anabatismo. Conrad Grebel, Felix Manz e George Blaurock
foram os expoentes iniciais do movimento, de modo que suas convicções estavam
em fase de desenvolvimento. Primeiramente, aderiram às reformas promovidas por
Ulrich Zwinglio, conceituado professor e pastor do Cantão de Zurique. Mas, como
Zwinglio não realizou reformas nos moldes das Escrituras, sujeitando-se mais ao
Conselho dos Duzentos do que a Deus, eles resolveram deixa-lo e buscar o cerne
da realidade cristã. Para tanto, retornaram exatamente ao início da carreira
cristã, ou seja, ao batismo. Foi em janeiro de 1525, através do rebatismo, que
Grebel estabeleceu a primeira comunidade anabatista restauradora dos padrões
neotestamentários. Esse grupo acreditava piamente nas instruções bíblicas,
seguindo-as de forma padrão e fiel.
Nesse momento, suas convicções demonstravam aversão à missa,
ao batismo infantil, à idolatria, à união da Igreja ao Estado, aos juros, às
indulgências, entre outras, e, no que diz respeito à questão posta, eram
pacifistas. Prova concreta disso, foram os martírios de Manz e de Blaurock que não
resistiram agressivamente aos seus perseguidores, antes, como “cordeiros foram
levados ao matadouro”. George Blaurock, apesar de não ter nos deixado muitos escritos,
fala-nos através de dois hinos compostos que demonstram sua completa devoção a
Deus e espiritualidade pacífica de dependência ao sumo pastor, de modo que quem
se expressa nestes termos demonstra uma vida pura e desprendida de ódio e
revolução:
Senhor Deus, como eu te exalto
Daqui e sempre,
Que a fé real me deu
Pelo qual eu posso saber.
Não me esqueça, ó Pai,
Esteja perto de mim sempre mais;
Seu Espírito protege e me ensine,
Que em grandes aflições
Seu conforto eu possa provar,
E valentemente possa obter
A vitória nesta luta.
Já Conrad Grebel, fala-nos um pouco mais sobre a vida
pacífica daqueles cristãos medievais desejosos não de uma revolução, mas de uma
restauração. Na carta 64 de 5 de setembro de 1524, direcionada a Thomas Munster,
ele exorta o ex-sacerdote luterano à prática da não resistência e o não
envolvimento com a guerra, censurando-o em razão de sua crítica aos príncipes.
Grebel escreveu: “O irmão de Hujuff escreve que você pregou contra os
príncipes, enfatizando que eles deveriam ser combatidos de próprio
punho. Se isso for verdade, ou se você pretende defender a guerra... eu devo
admoestar você pela salvação comum a todos nós...”.
Portanto, nossa questão a questão proposta é: como poderia
alguém com tanta devoção aos ensinos daquele que falou que os inimigos deveriam
ser amados, expressou um espírito brando e humilde através de cânticos, mas não
só por eles, contestou o uso de força contra as autoridades poderia ser chamada
de revolucionário e ativista? Confundir os munsteritas chamando-os de anabatistas
seria uma das possíveis respostas.
Referências
Lindberg, Carter. As reformas na Europa. Editora Sinodal: São Leopoldo, 2001.
Nenhum comentário:
Postar um comentário