Até ser reunida e formar o cânon
do qual dispomos hoje, a Bíblia Sagrada passou por um longo processo de
produção. Basta entendermos que sendo Moisés o “primeiro” escritor e João, o
discípulo amado, o último, passaram-se cerca de 1.700 anos. Neste período, a
possibilidade de mudanças sociais e culturais com tendências a alterar seu
conteúdo era alta, tendo em vista que os povos mudam durante suas histórias.
Contudo, o mais impressionante das Escrituras é verificar sua uniformidade e
constância, sobretudo a forma como ela vai propondo o ensino da verdade
paulatinamente ao ponto de a lei ser sombra de bens futuros (Hebreus 10:1),
enquanto que o Evangelho ser considerado “alegres novas de boas coisas”
(Romanos 10:15). A prevalência da Bíblia com respeito a outros livros
religiosos e dogmas demonstra-se através de fatos como este, muito embora se
julguem também inspirados. Essa conclusão, entretanto, fez surgir vários
conflitos religiosos, pois muitos não acreditam na supremacia bíblica. A queima
de Bíblias, por exemplo, demonstra a forma como os textos cristãos foram
menosprezados, tendo como fim a tentativa de aniquilamento de seus ensinos.
Apesar disso, a Bíblia foi preservada miraculosamente por providência divina.
Vejamos alguns fatos históricos que nos falam de situações como esta.
A Bíblia
inglesa, traduzida por John Wycliffe, foi perseguida por Roma:
Wycliffe,
vigário da Igreja de Saint Mary em Lutterworth, completou o Novo Testamento
inglês em 1380 e o Velho Testamento em 1382. Ele rejeitou muitas das heresias
de Roma, incluindo a doutrina de que o povo não deveria ter a Bíblia em sua
própria língua. Aqui está uma das poderosas afirmações que ele fez para as
autoridades católicas: “Você diz que é uma heresia falar das Sagradas
Escrituras em inglês. Você me chama de herege, porque eu traduzi a Bíblia para
a língua comum do povo. Você sabe quem blasfema? Não dá o Espírito Santo a
Palavra de Deus em primeiro lugar na língua materna das nações a quem foi
dirigida? Por que você fala contra o Espírito Santo? Você diz que a Igreja de
Deus está em perigo com este livro. Como pode ser isso? Não é somente da Bíblia
que aprendemos que Deus criou uma sociedade tal como Igreja sobre a terra? Não
é a Bíblia que dá toda a sua autoridade à Igreja? Não é da Bíblia que
aprendemos quem é o Construtor e Soberano da Igreja, quais são as leis pelas
quais ela é governada, e os direitos e privilégios dos seus membros? Sem a
Bíblia, que permissão tem a Igreja para mostrar tais coisas a todos esses? É
você quem coloca a Igreja em perigo ao esconder o mandado Divino, a missiva
real de seu Rei, a autoridade que ela exerce e a fé que ela ordena” (David
Fountain, John Wycliffe, pp. 45-47).
Roma
perseguiu amargamente Wycliffe e tentou, sem sucesso, prendê-lo. O Papa
Gregório XI emitiu cinco bulas contra Wycliffe, mas ele foi protegido pela
rainha da Inglaterra e outros.
Wycliffe
morreu em 31 de dezembro de 1384, e 43 anos mais tarde, em 1428, a Igreja
Católica desenterrou os seus ossos e os queimou.
Roma
também perseguiu os seguidores de Wycliffe, os lolardos, aprisionando-os e
condenando muitos deles à morte. A torre dos lolardos em Londres foi assim
chamada porque é um dos lugares onde eles foram presos e torturados. Era ilegal
possuir uma cópia da Bíblia de Wycliffe, e a maioria das inestimáveis
Escrituras manuscritas foram queimadas.
Willian
Tyndale é outro exemplo de tradutores da Bíblia para o vernáculo perseguido
pelo catolicismo romano:
Quando
jovem, Tyndale sentiu que tinha a obrigação de traduzir a Bíblia para o inglês
diretamente do hebraico e grego, para que seu povo pudesse ter a Palavra de
Deus das mais puras fontes. Quando ele expressou este plano para as autoridades
católicas na Inglaterra, então sob domínio católico, ele soube que não seria
possível fazer este trabalho em seu próprio país.
Enquanto
trabalhava em Little Sodbury Manor após a sua graduação em Oxford, Tyndale
pregou naquela parte do oeste da Inglaterra e debateu a verdade com padres
católicos. Uma noite, um padre exclamou: “Estamos melhor sem as leis de Deus do
que as do papa”. Ouvindo isso, Tyndale replicou: “Se Deus poupar minha vida por
muitos anos, farei com que um menino que empurra um arado saiba mais das
Escrituras do que vós”.
Tyndale
viajou para o continente para alcançar este objetivo, onde ele teve que se
mudar de um lugar para outro e esconder seu trabalho por causa das autoridades
eclesiásticas.
Depois
de completar o Novo Testamento e uma porção do Velho, Tyndale foi preso em maio
de 1535. Ele ficou preso por 16 meses no castelo de Vilvorde, Bélgica.
Em 6 de
outubro de 1536, Tyndale foi estrangulado e depois queimado na fogueira. Suas
cinzas foram jogadas no rio que corria ao lado do castelo.
Os
anabatistas também fizeram sua tradução das Escrituras para a língua do povo,
mas amargaram duras perseguições e martírio:
A Bíblia
alemã produzida por anabatistas apareceu em 1529, cinco anos antes da Bíblia
completa de Lutero. Ela foi chamada a de A BÍBLIA DE WORMS, de acordo com o
nome da cidade em que foi publicada. A tradução foi feita por dois anabatistas,
Ludwig Hetzer e Hans Denck, “talentosos eruditos, bem versados em hebraico e
grego, bem como em latim. Denck estudou e recebeu o grau de mestre na
Universidade de Basel, sob e com Erasmus. Hetzer foi um aluno de Basel, e
também da Universidade de Paris” (John Porter, The World’s Debt to the
Baptists, 1914, p. 138). “Na época da sua publicação a aprovação da edição
Denck-Hetzer foi ilimitada e universal. No prazo de três anos treze edições
separadas apareceram em Estrasburgo, Augsburgo, Hagenau, e outros lugares... Em
uma palavra, em toda a Alemanha o livro dos desprezados anabatistas foi
comprado, lido, e estimado” (Ludwig Keller, Hans Denck, Ein Apostel
der Wiedertaufer, p. 211; cited by Porter, p. 139).
Esta
Bíblia alemã e seus tradutores sofreram o destino que já vimos tantas vezes. “Denck,
sofrendo com a tuberculose, sob o decreto de banimento e proscrição, morreu na
clandestinidade, na Basiléia, em 1529, um pouco antes da Bíblia vir a ser
impressa. Hetzer foi preso, condenado como herege, e decapitado no mesmo ano em
Constance... TODO O ESFORÇO POSSÍVEL FOI FEITO PARA SUPRIMIR ESTA ‘BÍBLIA
HERETICA’; ESCRITÓRIOS DE IMPRESSÃO, LUGARES ONDE O LIVRO ERA VENDIDO,
CASAS PARTICULARES E PESSOAS FORAM REVISTADAS, E TODAS AS CÓPIAS ENCONTRADAS
ERAM DESTRUÍDAS. Apenas três cópias que são acessíveis a acadêmicos vieram
agora ao conhecimento da existência, uma está na biblioteca da Universidade de
Bonn, uma em uma biblioteca em Stuttgart, e uma na Biblioteca Pública de Nova
York”.
De fato,
a proposta das Escrituras de ser a única fonte da verdade provoca grande
antipatia, principalmente, dos religiosos cujos intentos pretendem manobrar seu
conteúdo para formularem novos dogmas, servindo-se dos fundamentos cristãos
para tantas inovações e desdobramentos considerados equivocados que culminam
com um pleno desvio do ensino primaz de Cristo. Apesar disso, Deus sempre
preservou suas máximas com grande poder e autoridade, não permitindo sua
Palavra desaparecer.
Cloud,
David W. “Way of Life Literature”. Traduzido por Edimilson de Deus Teixeira.
Disponível em http://www.discernimentobiblico.net/As%20pergui%E7%F5es%20do%20catolicismo%20contra%20a%20b%EDblia.html