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segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Os anabatistas eram revolucionários ou pacifistas?

“O anabatismo primitivo era um movimento religioso e de revolução social” (Wohlfeil, Goertz 1980, p. 43) que não se opunha a fazer uso da espada em favor de sua causa (Stayer 1972). Contudo após os Artigos de Schleitheim (1527), eles recusaram-se a portar armas”.
(Lindberg, p. 243)

Uma das premissas mais corriqueiras na Academia é aquela que enfatiza o conhecimento como provisório. Chegou-se a essa conclusão, não simplesmente por achismos ou conclusões insustentáveis, mas sim, pelo amparo e fundamento em fatos concretos que conseguem desafazer uma argumentação teórica inicial. Baseados nesse pensamento, propomos uma análise da informação acima sobre o anabatismo, já que o trata como uma vertente similar ao catolicismo e ao protestantismo da época, cuja ação militarizada era pauta constante naqueles tempos pré-nacionalistas. Então, será que na gênese anabatista verificou-se a conduta de luta armada e revolucionária?
Para responder esse questionamento, importa trazermos à tona a concepção cristã do anabatismo. Conrad Grebel, Felix Manz e George Blaurock foram os expoentes iniciais do movimento, de modo que suas convicções estavam em fase de desenvolvimento. Primeiramente, aderiram às reformas promovidas por Ulrich Zwinglio, conceituado professor e pastor do Cantão de Zurique. Mas, como Zwinglio não realizou reformas nos moldes das Escrituras, sujeitando-se mais ao Conselho dos Duzentos do que a Deus, eles resolveram deixa-lo e buscar o cerne da realidade cristã. Para tanto, retornaram exatamente ao início da carreira cristã, ou seja, ao batismo. Foi em janeiro de 1525, através do rebatismo, que Grebel estabeleceu a primeira comunidade anabatista restauradora dos padrões neotestamentários. Esse grupo acreditava piamente nas instruções bíblicas, seguindo-as de forma padrão e fiel.
Nesse momento, suas convicções demonstravam aversão à missa, ao batismo infantil, à idolatria, à união da Igreja ao Estado, aos juros, às indulgências, entre outras, e, no que diz respeito à questão posta, eram pacifistas. Prova concreta disso, foram os martírios de Manz e de Blaurock que não resistiram agressivamente aos seus perseguidores, antes, como “cordeiros foram levados ao matadouro”. George Blaurock, apesar de não ter nos deixado muitos escritos, fala-nos através de dois hinos compostos que demonstram sua completa devoção a Deus e espiritualidade pacífica de dependência ao sumo pastor, de modo que quem se expressa nestes termos demonstra uma vida pura e desprendida de ódio e revolução:

Senhor Deus, como eu te exalto
Daqui e sempre,
Que a fé real me deu
Pelo qual eu posso saber.
Não me esqueça, ó Pai,
Esteja perto de mim sempre mais;
Seu Espírito protege e me ensine,
Que em grandes aflições
Seu conforto eu possa provar,
E valentemente possa obter
A vitória nesta luta.   

Já Conrad Grebel, fala-nos um pouco mais sobre a vida pacífica daqueles cristãos medievais desejosos não de uma revolução, mas de uma restauração. Na carta 64 de 5 de setembro de 1524, direcionada a Thomas Munster, ele exorta o ex-sacerdote luterano à prática da não resistência e o não envolvimento com a guerra, censurando-o em razão de sua crítica aos príncipes. Grebel escreveu: “O irmão de Hujuff escreve que você pregou contra os príncipes, enfatizando que eles deveriam ser combatidos de próprio punho. Se isso for verdade, ou se você pretende defender a guerra... eu devo admoestar você pela salvação comum a todos nós...”.
Portanto, nossa questão a questão proposta é: como poderia alguém com tanta devoção aos ensinos daquele que falou que os inimigos deveriam ser amados, expressou um espírito brando e humilde através de cânticos, mas não só por eles, contestou o uso de força contra as autoridades poderia ser chamada de revolucionário e ativista? Confundir os munsteritas chamando-os de anabatistas seria uma das possíveis respostas.

Referências

Lindberg, Carter. As reformas na Europa. Editora Sinodal: São Leopoldo, 2001.

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